2003

Adeus ao corpo

por David Le Breton

Resumo

Nas sociedades contemporâneas desenvolve-se um discurso do ódio do corpo, fundado especialmente na ideia de que o corpo seria obsoleto, anacrônico, neste mundo dominado pelas ideias de comunicação, velocidade, rendimento e eficiência. O corpo seria apenas rascunho irrisório a ser retificado pela tecnociência ou mesmo a ser eliminado, como sustenta com convicção parte da cibercultura americana. O corpo tornou-se o lugar do mal, numa forma de gnose laica e moderna; a saúde só virá com a modificação ou a eliminação do corpo. Quais são as diferentes declinações deste desprezo do corpo e os discursos que as sustentam?

Para o discurso científico contemporâneo, o corpo é pensado como matéria indiferente, simples apoio da pessoa, a tal ponto que se torna objeto manipulável, para ser aperfeiçoado, matéria-prima em que se dilui a identidade pessoal. Pensando assim, ele deixa de ser raiz da identidade do homem. Ao mesmo tempo que torna o corpo um objeto suspeito, a medicina transforma-se em biopoder.

Enquanto certos biólogos sonham, por exemplo, em eliminar a mulher do começo ao fim da gestação, a ciber-sexualidade realiza plenamente este imaginário do desaparecimento do corpo. É assim que, para alguns, o corpo não está mais à altura das capacidades requeridas pela era da informação: convém livrar-se dele forjando um corpo biônico em que se insere um disquete contendo o espírito. É essa vontade explícita do nosso mundo ocidental que quer transformar e mesmo liquidar o corpo.

 


O FIM DO CORPO

O corpo é visto por alguns entusiastas das novas tecnologias como um vestígio indigno fadado a desaparecer em breve. Ele se transforma em membro excedente,[1] em obstáculo à emergência de uma humanidade (que alguns já chamam de pós-humanidade) finalmente liberta de todas as suas peias, das quais a mais duradoura é o fardo do corpo. Esses novos gnósticos dissociam o sujeito de sua carne perecível e querem imaterializá-lo em benefício do espírito, único componente digno de interesse. Anacrônico, o corpo deve desaparecer logo, a fim de permitir o acesso a uma humanidade gloriosa, livre, enfim, dessa “carne” que o enraíza no mundo. Em Neuromancer, livro cult da cibercultura, Case, culpado de ter ocultado informações de seus empregadores, é expulso da Matriz (o ciberespeaço) e condenado a seu corpo. “Para Case, que vivera apenas para a exultação desencarnada do ciberespaço, isso foi a Queda. Nos bares que frequentava em seus tempos de glória, a atitude elitista exigia certo desprezo pela carne. O corpo era a carne. Case se tornara prisioneiro de sua própria carne.”[2]  Ao reencontrar a conexão com a Matriz, Case recupera a bem-aventurança, volta a ser consciência pura. Ele só tem existência real no ciberespaço, somente ali é um sujeito integral. É ajudado em sua busca por um ex-pirata informático morto, mas cujo espírito continua vivo, sintetizado no interior do computador.

O corpo não é mais uma fronteira identitária, mas vestígio deixado no espaço. A redução do corpo à “carne” (meat) reaparece no periódico Mondo 2000, segundo o qual isso expressa a “frustração que os usuários da infoesfera, que pode se estender indefinidamente, experimentam ante as limitações impostas a seu espírito viajante pelas exigências do corpo”. Esse termo pejorativo para designar o corpo aparece naturalmente nos escritos de Marvin Minsky, um importante teórico do pensamento artificial, mas usado dessa vez em relação ao cérebro (a meat machine). Conectados ao ciberespaço, os corpos se dissolvem. “Suspenso no universo do computador”, diz Heim, “o cibernauta abandona a prisão do corpo e entra num mundo de sensações digitais.”[3] O viajante da infoesfera não se sente mais preso a um corpo físico, ele conduz sucessivas explorações sob identidades geralmente diferentes, em um mundo imaterial. Não importam sua idade, seu sexo, nem mesmo se está doente ou é deficiente, ele é livre para mover-se à vontade e segundo sua competência em um universo de dados. Seu corpo físico, comparado a seus múltiplos corpos virtuais, não é senão uma prisão, uma necessidade antropológica que de bom grado ele dispensaria. O corpo eletrônico atinge a perfeição, imune à doença, à morte, à deficiência física. Ele representa o paraíso na terra, um mundo sem a espessura da carne, dando viravoltas no espaço e no tempo de maneira angelical, sem que o peso da matéria impeça seu avanço. Como água que se mistura à água, a carne eletrônica se dissolve em um universo de dados que nada pode deter. A net tornou-se a carne e o sistema nervoso dos que não podem mais passar sem ela e que sentem apenas desdém por seu antigo corpo, ao qual, no entanto, sua pele permanece colada.

Uma comunidade virtual norte-americana — os extropianos (que estão fora da entropia) — quer prolongar ao infinito sua existência, graças ao aperfeiçoamento da técnica. Se morrerem, apesar de seus esforços de imortalidade, seus restos mortais serão postos em hibernação até que se descubra uma maneira de medicar seus males e trazê-los de volta à vida. Eles se ocupam com a possibilidade de transferir seus espíritos para a net, a fim de se libertar definitivamente do corpo e de viver umá vida virtual e eterna. Para D. Ross, seu teórico, “basta” construir um programa de computador com cada neurônio e cada sinapse de um cérebro particular, para que se faça a transferência entre o espírito, com toda a sua memória, e o computador, deixando o corpo de lado. Como o homem vale apenas por seu cérebro, a dissolução do corpo não altera em nada sua identidade, mas livra o extropiano da possibilidade de doenças, acidentes ou da morte. Se ele ficar entediado no ciberespaço, poderá voltar atrás, “simplesmente” reconstruindo um novo corpo, a partir de seu DNA ou de um outro corpo, mas igualmente por clonagem, e para o qual transportará seu espírito.

  1. J. Sussman, professor no Massachusetts Institute of Technology (MIT), lamenta não obter agora a imortalidade que lhe parece tecnicamente tão próxima. Sonha em desvencilhar-se de seu corpo e assim livrar-se da morte: “Se você for capaz de fazer uma máquina que contenha seu espírito, então a máquina será você mesmo. Que o diabo carregue o corpo físico, não interessa. Uma máquina pode durar eternamente. Mesmo se ela pára, você pode ainda transferir-se para um disquete e ser transportado até uma outra máquina. Todos gostaríamos de ser imortais. Temo, infelizmente, que sejamos a última geração a morrer”.[4] O imaginário milenarista de abandonar o corpo graças ao computador é amplamente compartilhado. Damos aqui apenas alguns exemplos. R. Jastrow, pesquisador espacial, pensa que, “integrado a um computador, o cérebro humano é liberado de sua carne mortal. Conectado a câmeras e outros instrumentos, o cérebro vê, sente e responde a stimuli. Ele controla seu próprio destino. A máquina é seu corpo; ele é o espírito da máquina. A união do espírito e da máquina cria uma nova forma de existência para o homem do futuro”.[5]

Minsky leva ao extremo a mística da inteligência artificial e o desprezo pelo corpo, marcando uma data para o teletransporte do “espírito” ao computador:

A ideia de morrer após ter acumulado conhecimento suficiente para resolver um problema é desoladora. Sem falar de imortalidade, que sejam apenas 150 anos de vida a mais, por que não? E não há razão para temer que o sistema entre em pane: se usarmos uma boa tecnologia, poderemos substituir cada parte (…)  Além disso, poderíamos fazer duas cópias de nós mesmos, para o caso de uma não funcionar mais. Talvez até múltiplas cópias de nós, com vidas diferentes.

Aliás, Minsky escreveu, em colaboração com Harry Harrison, o romance The turing option (1992), onde antecipava uma sociedade em que os homens podem teletransportar seu espírito para o computador, a “sociedade dos espíritos” com que ele sonha. O artista plástico Stelarc considera o corpo obsoleto em meio ao ambiente tecnológico contemporâneo. Para ele, o corpo perdeu toda utilidade, substituído por máquinas mais eficientes na maior parte de suas funções. Doravante, é um obstáculo à recepção da miríade de informações que hoje se impõem ao conhecimento do homem:

É tempo de nos perguntarmos se um bípede, com um corpo que respira e palpita, com uma visão binocular e um cérebro de 1400 cm é ainda uma forma biológica adequada. A espécie humana criou um ambiente técnico e informativo que ele não é mais capaz de acompanhar. Por um lado, é esmagado pela velocidade, pela precisão e pelo poder da tecnologia; por outro, é submergido pela quantidade e pela complexidade das informações acumuladas.[6]

Segundo ele, um corpo à altura dos desafios contemporâneos só pode ser uma estrutura biônica indiferente às antigas formas humanas. Se o computador é um lugar infinitamente propício para abrigar o espírito, ele é igualmente promovido à condição de corpo glorioso, de libertação de um mundo biologicamente impuro. Timothy Leary fala da imersão do homem, finalmente desprovido de corpo, no próprio interior da máquina. Ambos despedem-se das antigas formas de humanidade, ultrapassadas, segundo eles, pelos progressos técnicos:

Num futuro próximo, o homem tal como o conhecemos hoje, essa criatura perecível, não será mais que uma simples curiosidade histórica, uma relíquia, um ridículo ponto perdido em meio a uma inimaginável diversidade de formas. Se tiverem vontade, indivíduos ou grupos de aventureiros poderão reconstruir essa prisão de carne e de sangue, o que, em atenção a eles, a ciência fará com prazer.[7]

Para Hans Moravec, especialista em robótica, a obsolescência do corpo humano é um fato consumado, a tarefa principal consiste em desembaraçar-se da carne supérflua que limita o desenvolvimento tecnológico de uma humanidade em plena metamorfose. “No atual estado das coisas”, escreve,

somos infortunados híbridos, em parte biológicos, em parte culturais: muitos traços naturais não correspondem às invenções de nosso espírito. Nosso espírito e nossos genes talvez compartilhem objetivos comuns ao longo de nossa vida. Mas o tempo e a energia dedicados à aquisição, ao desenvolvimento e à difusão das ideias contrastam com os esforços dedicados à manutenção de nossos corpos e à produção de uma nova geração.[8]

O corpo é a ruína de muitos dos esforços do espírito. Além disso, um dia a morte aniquila em um instante esses esforços. Entramos, segundo Moravec, numa era “pós-biológica”, o mundo em breve verá o triunfo de robôs pensantes, infinitamente complexos e eficazes, que não mais se distinguirão da humanidade atual a não ser por sua perfeição técnica e pelo abandono do corpo. “Um mundo no qual o gênero humano será varrido por uma mutação cultural e destronado por sua própria progênie artificial.”[9] Certamente, as máquinas contemporâneas estão ainda em sua infância, são primárias, exigem muitos aperfeiçoamentos antes de atingir esse nível último que fará do homem biológico uma criatura definitivamente obsoleta. “Mas”, diz Moravec, “já a partir do próximo século elas se tornarão entidades tão complexas como nós mesmos, para logo depois transcenderem tudo o que conhecemos […] Livres das pesadas coerções da evolução biológica, esses filhos de nosso espírito poderão enfrentar os grandes desafios do universo irão buscar sua própria fortuna, enquanto nós, seus velhos pais, nos extinguiremos docilmente.”[10] Essas máquinas inteligentes e autônomas saberão garantir seu sustento, seu aperfeiçoamento, sua reprodução, totalmente indiferentes a uma humanidade destinada ao desuso. “Nosso DNA se verá sem trabalho: ele terá perdido a corrida da evolução, em proveito de uma nova forma de competição.”[11]

Para Moravec, o desenvolvimento da máquina é precisamente a salvação da humanidade. Ele toma Descartes ao pé da letra ao dissociar de maneira radical o corpo e o espírito, e ao fazer do primeiro apenas a máquina indiferente que contém o segundo. Assim como dados informatizados podem ser facilmente transferidos de um computador a outro, logo chegaremos, com a mesma facilidade, a transferir o espírito humano para a máquina. O transplante do cérebro em um corpo robótico, mas constituído de material biológico, liberaria o homem de seus entraves físicos. Moravec não duvida que várias soluções logo estarão disponíveis. Segundo ele, um scanner ideal, de alta resolução, transporia numa fração de segundo todos os dados intelectuais e afetivos do indivíduo a uma nova morada, mais apropriada que o antigo corpo.

O CIBERESPAÇO

O ciberespaço é hoje um modo de existência integral, com linguagens, culturas, utopias. Mundo real e imaginário, de sentidos e valores que só existem a partir do cruzamento de milhões de computadores que colocam provisoriamente em contato indivíduos afastados no tempo e no espaço e que, às vezes, nada sabem uns dos outros. Mundo onde as fronteiras se confundem e onde o corpo se apaga, onde o Outro existe na interface da comunicação, mas sem corpo, sem rosto, sem outro toque além daquele do teclado do computador, sem outro olhar além do da tela. Livre das coerções corporais habituais, em um mundo simplificado cujas chaves são fáceis de manipular, o viajante virtual conhece realmente um mundo fictício, sente fisicamente um mundo sem carne. Nesse universo sintético, o jogo com as situações produz todas as aparências da verdade, sem o ônus da prova e podendo viver inúmeras atividades inéditas. Apesar de sua reduzida mobilidade, o indivíduo vive uma plenitude sensorial que a sociedade não lhe proporcionaria com tanta generosidade. Ele se desloca concretamente em um universo reconstituído. Ao dissociar corpo e experiência, ao tornar irreal a relação com o mundo e transformá-la em relação com dados, o virtual legitima, aos olhos de muitos intemautas (ou defensores radicais da inteligência artificial), a oposição essencial entre espírito e corpo, levando ao fantasma de uma onipotência do espírito. A realidade virtual está aquém e além do corpo, este é passivo mesmo se ecoa inumeráveis efeitos de sensações e de emoções provocadas por imagens.

Sem sair de seu quarto, fiel à injunção pascaliana, é possível lançar-se nas correntezas do rio Verdon, na Provença, surfar nas ondas de um spot do México, caçar leões em uma floresta equatorial, despir a mulher dos seus sonhos num jogo erótico, antes de arrastá-la num tórrido amplexo virtual, dialogar durante horas com ciberamigos do outro lado do mundo, dos quais se conheçam apenas o pseudônimo e as reações textuais que expressam, participar de um jogo de RPG com parceiros invisíveis, tornar-se um cavaleiro medieval com um punhado de apaixonados pela mesma época etc. É possível viver em uma cidade virtual, com apartamento, profissão, lazer, vizinhos, amigos, ir a uma sala de espetáculos, informar-se sobre o caminho com outros internautas que vão para lá etc. É possível assistir a partos transmitidos ao vivo, e a própria morte não escapa mais à Net. Um site canadense permite acompanhar um funeral por meio de uma câmera conectada à rede. Outro site, criado por doentes e seus familiares, foi concebido como uma sepultura virtual onde figuram as efígies de pessoas falecidas e os epitáfios redigidos por sua família ou por internautas de passagem. As páginas consagradas aos desaparecidos apresentam fotos ou textos. É possível também depositar flores virtuais sobre os túmulos. Tendo dispensado o corpo, todas as metamorfoses são permitidas: tornar-se uma pedra que rola, um violino, um salmão que sobe um rio, um piloto de avião etc. Uma coisa liga-se à outra, toda separação foi abolida. E esse mundo em que se sonha acordado pode ser compartilhado com outros, de maneira simultânea ou interativa. Se o computador é uma oportunidade para portadores de deficiências motoras, limitados em seus movimentos, a inércia motora que ele provoca nos demais usuários é fonte de ambiguidade. Com o passar do tempo, o corpo transforma-se num estorvo, excrescência desastrosa do computador.

Se o longínquo está infinitamente próximo, a comunicação fora do corpo distancia o imediato, inscreve-se no afrouxamento dos vínculos sociais, no alargamento do espaço pessoal. As comunidades virtuais desenham um universo abstrato geralmente mais íntimo que a família ou a vizinhança. Os ciberamigos são às vezes mais íntimos que as pessoas mais próximas, porque jamais os encontramos. No limite, pode-se imaginar que dois usuários de um site que se apaixonam um pelo outro morem no mesmo andar, nunca se cumprimentem e se achem mutuamente antipáticos. A supressão do corpo favorece os “contatos” com numerosos interlocutores. De fato, todo a priori é suprimido, qualquer incômodo, preconceito, timidez em relação ao outro, e isso principalmente porque a comunicação é reduzida a sua função fática, e ninguém sabe realmente quem está do outro lado da tela. O obstáculo geográfico ou temporal é removido, mas também, mais radicalmente, o do corpo, permitindo uma troca imediata sem o esforço da abordagem. É sintomático, a esse respeito, o amor louco que nasce entre dois nerds na narrativa de Coupland. Eles nunca se viram, mas correspondem-se regularmente por e-mail há vários meses. Ignoram até o sexo de cada um, pois ambos usam pseudônimos. Quando se impõe o momento do encontro, um deles, assaltado pelo medo desse primeiro “contato”, envia um amigo em seu lugar.[12] O corpo é claramente vivido como a difícil prova da verdade que ameaça romper a euforia dessa troca fora do corpo.

Superequipado com meios que lhe permitem comunicar-se sem precisar deslocar-se (telefone celular, e-mail, internet etc.), o indivíduo não precisa mais, necessariamente, se encontrar fisicamente com outros; a conversa frente a frente durante um passeio tranquilo ou em um lugar silencioso parece hoje perder espaço diante do diálogo apaixonado do proprietário de um celular ou computador com seus interlocutores invisíveis e falantes.[13] As incontáveis conversas virtuais, frágeis e efêmeras, são hoje sintomas das carências do vínculo social, indicam uma sede de contato e, ao mesmo tempo, uma preocupação de preservar-se, de não se comprometer demais. As comunidades virtuais são de fato uma “sociedade dos espíritos”, numa versão diferente da de Minsky. A carne do mundo ou o conteúdo das coisas transforma-se em um kit de informações. Com isso, as fronteiras entre os mundos, os objetos e os homens se desvanecem, tudo pode ser potencialmente trocado, pois tudo se rege, em última instância, pelas mesmas unidades de base. Mas às vezes a confusão é mortal. Alguns indivíduos não percebem mais a diferença entre o virtual e o real, como as crianças que mataram um comerciante mas queriam apenas atirar, e não provocar a morte. Essas interferências são frequentes. O fato de viver num mundo sem obstáculos, onde mortos se levantam e onde saltos no vazio não causam nenhum dano, traz o risco do esquecimento das consequências reais de nossas ações no mundo real.

O ciberespaço está livre de todas as coerções físicas e de qualquer submissão à espera. Já de início o indivíduo mergulha em um mundo cujos reveses ele não precisa temer e do qual ele se apropria jogando, sem coerções espaciais ou geográficas. Diante da tela do computador, ele é como um astronauta em sua nave, seu corpo é uma extensão incômoda que o impede de conhecer a rede perfeita, tornando-se ele próprio informação pura, sem limites. Ele mergulha em outra dimensão da realidade. Estar fora do espaço e do tempo implica a eliminação do corpo, mantendo no entanto a agitação das sensações fortes, das vertigens, de formas sensoriais reduzidas porém pregnantes, do vôo, da ausência de gravidade, da fadiga etc. “Nosso destino”, diz McKenna, “é nos tornarmos o que pensamos, vermos nossos pensamentos se tornarem corpos e nossos corpos, pensamentos.”[14] O ciberespaço é a “celebração do espírito (…) É um reino em que a mente é liberada dos limites corporais, ambiente favorável a toda a potência do pensamento”.[15] Poderíamos listar uma longa série de definições idênticas. O espanto sentido é exatamente o do corpo que se vê livre da gravidade, o do abandono das impressões corporais ordinárias, com o que elas implicam de imprevisibilidade.

No ciberespaço o sujeito libera-se das coerções da identidade, metamorfoseia-se, de forma provisória ou permanente, no que ele quer, sem temer que o real o desminta. Sem rosto, não corre mais o risco de poder ser visto, está livre de toda responsabilidade, tendo agora apenas uma identidade volátil. Na rede as características sexuais e a idade são puramente efeitos de um texto, objetos de uma descrição cuja origem não pode ser verificada e que autorizam todo tipo de licença. Imaterial, o sujeito encarna um cogito puro, reduz-se estritamente às informações que fornece: ele é o que pensa que é quando está conectado a um universo onde os outros são jogadores assim como ele. Não há mais o risco de ser traído ou reconhecido por seu corpo. A rede favorece uma pluralidade de “eus”, o jogo libera-o de qualquer responsabilidade e favorece a todo instante a possibilidade de desaparecer. A identidade é uma sucessão de “eus” provisórios, um disco rígido que contém uma série de arquivos que podem ser acessados ao sabor das circunstâncias. Mundo relativamente anônimo, feito de acúmulos e, nesse sentido, propício a um exercício da liberdade sem coerções, para o bem ou para o mal. É uma máscara formidável, isto é, um estímulo ao relaxamento de toda civilidade.[16] Toda responsabilidade desaparece. Um crime virtual não deixa vestígios. O ciberespaço é um instrumento da multiplicação de si, uma prótese da existência. Um estudante encontrado por Sherry Turkle diz: “Por que dar mais importância ao eu que tem um corpo do que aos diversos outros que não possuem, se estes últimos permitem viver outros tipos de experiência?”.[17] Sob esse aspecto, o ciberespaço é uma espécie de sonho acordado para os que querem brincar mais profundamente com sua identidade, sem temer um choque ao retornar ao real; ele permite a construção de incontáveis mundos e de múltiplas formas de encarnação virtual, não mais submetidos ao princípio da realidade, mas inteiramente sob a égide do prazer e do imaginário.

O ciberespaço envolve a relação com o mundo, dando ao sujeito que o investe passionalmente o sentimento de que tem a “verdadeira vida” na ponta dos dedos, e que cabe a ele construir uma existência virtual à sua maneira, já que os limites e a constância da soberania pessoal que o corpo encarna na vida ordinária são aqui radicalmente suprimidos. O tempo da conexão abre-se a um mundo descorporificado, sem interioridade, pura superfície. O corpo não se impõe nem mesmo como injunção de identidade, pois a esse respeito todos os jogos são possíveis. Pessoas deficientes ou gravemente doentes têm a oportunidade de mover-se à vontade, sem temer obstáculos físicos, ou de comunicar-se sem temer serem estigmatizadas. O peso do corpo é eliminado, não importa a idade, a saúde, a conformação física; os internautas encontram-se em um plano de igualdade justamente pelo fato de o corpo ser colocado entre parênteses.Ainda que seja uma simulação do mundo, o ciberespaço oferece aos apaixonados o sentimento da realidade física de seu universo. As percepções são realmente sentidas, mesmo que o corpo da realidade virtual seja incorpóreo. O cinema também provoca emoção e “esquecimento” do corpo, mas o que o virtual propõe é passar ao que está atrás da tela, chegar ao núcleo da ação. Timothy Leary regozija-se porque o ciberespaço livra o homem da “escravidão do corpo”. Segundo ele, no futuro o Outro será lentamente afastado, tornando-se, no entanto, bem mais próximo:

As trocas diretas, face a face, serão reservadas às grandes ocasiões, aos acontecimentos íntimos e raros, quase sacramentais: Os encontros físicos serão raros, exaltantes. Num futuro próximo, nos veremos implicados em inúmeras ciber-relações com pessoas que certamente nunca veremos pessoalmente(…) Amanhã, graças a nossos cérebros, voaremos nas asas dos elétrons para trabalhar em Tóquio, ou para, magnificamente acompanhados, uma saborosa refeição em um restaurante parisiense, antes de visitar nossos parentes em Seattle, tudo isso sem deixar fisicamente nossa sala.[18]

AMPLEXOS VIRTUAIS

A sexualidade transforma-se em textualidade e dispensa o corpo, a excitação verbal transmite-se a todo o corpo, como um terminal de prazer. Procedimentos mútuos com o prazer no final. Entre os que vivem uma experiência sexual telemática, alguns falam de seu entusiasmo, “insistem na veracidade do adágio segundo o qual, no sexo, o essencial é o mental”.[19] Em muitos chats, o internauta pode cortejar um(a) parceiro(a) virtual na “sala” e levá-lo(a) para outro lugar a fim de evitar o controle dos “guias”. Uma vez nesse “quarto” virtual, cada parceiro descreve textualmente suas ações e expressa com exclamações o prazer experimentado. Na net as baladas não são desprovidas de risco. Há registros de violações virtuais, quando um internauta é controlado por seu interlocutor, que o força a uma relação sexual (ou melhor, textual).

Na rede, muitos internautas mudam de sexo e se divertem com a ideia de pregar uma peça no Outro. Suplemento picante do prazer, homens fazem-se passar por mulheres a fim de viver uma experiência de sexo virtual com homens, mulheres assumem a identidade de um homem para se aproximar de outras mulheres nas salas de chat ou nos inc. Sua motivação é experimentar papéis proibidos na vida real, em razão da injunção de identidade que preside as interações. “Saber se o outro é realmente um homem ou uma mulher tornou-se uma forma de arte”, diz Sherry Turlde.[20] O internauta, segundo a imagem que Turkle evoca por experiência própria, adota às vezes traços de personalidades múltiplas e entrega-se “a diferentes rotinas, diferentes amigos, diferentes nomes”, fazendo da tela um espaço de jogo. Alguns MUDS [Multiple User Dimension, Multiple User Dungeon ou Multiple User Dialogue, programas que oferecem uma realidade virtual que o usuário pode explorar, encarnando uma personagem] permitem que se escolha o sexo: masculino, feminino ou neutro. Outros ampliam ainda mais o repertório de gêneros: homem, mulher, plural, neutro, hermafrodita etc. Ao atravessar o espelho, o usuário, autorizado pela ausência do rosto do outro na interação, libera as fantasias sexuais e os jogos de identidade.

Em breve, através da combinação entre estimuladores sensoriais (data suits) dotados de conversores capazes de enviar descargas elétricas diferentemente moduladas a todo o corpo (especialmente as zonas erógenas) e data gloves (luvas que respondem com estímulos táteis), o internauta sentirá fisicamente os estímulos oferecidos por seu parceiro. Será o contato virtual, dados com dados, passando à frente do contato corpo a corpo. Múltiplos meios de conexão estão no horizonte. Os parceiros delegam sua pessoa à figura de um avatar cuja forma escolhem segundo as propriedades físicas desejadas. Carícias serão feitas por movimentos do mouse, possibilitando zooms ou que se mude a posição do corpo do avatar do outro. Um repertório de imagens de torsos e quadris femininos e masculinos permitirá a simulação de uma construção telemática do corpo do parceiro. A pele é uma tela. Até mesmo conexões de voz são possíveis via internet, para criar “a atmosfera alquímica de estimulação cerebral e de excitação sensorial que lembre uma situação sexual e não mecânica”.[21] Bastará clicar sobre uma parte do corpo, definir a qualidade, a duração da carícia ou da ação e confirmar. A combinação de dados escolhida pelos dois parceiros não deixa nada ao acaso:

Suas partes mais evidentes representam protuberâncias negras e fálicas entre as coxas. Trata-se, na verdade, de um elemento fálico que penetra e vibra se a combinação é acionada por um ser com órgãos genitais femininos, e de um falo côncavo se é acionada por um ser com órgãos genitais masculinos. Um segundo vibrador, nesse caso anal, está situado na parte posterior da combinação.

O tátil converte-se em digital, o teclado substitui a pele, o mouse substitui a mão. E o interativo suplanta o dialógico, ainda que tecnicamente muitos progressos ainda precisem ser feitos. A sexualidade sem corpo é sobretudo visual, representa a hipertrofia do olhar; o tato é estimulado por conversores; eventualmente, também é auditiva, a partir de sons registrados anteriormente ou de um programa que associe gestos e emissões sonoras; ela não é olfativa. Falta essa dimensão do corpo que acompanha intimamente o erotismo. Ela é digital e virtual, real em sentido metafórico, pois de fato provoca sensações, mas sem contato com o Outro. Helena Velena evoca outro sistema. Com o corpo coberto por uma combinação de dados, o internauta, acariciando uma parte do corpo, estimula a parte correspondente no parceiro. Ele se toca nos seios ou no sexo e o outro tem a sensação de ser tocado no mesmo lugar.

Aprende-se a amar o corpo do parceiro conhecendo sensualmente o nosso. E, por força das coisas, o corpo mesmo adquire importância ao tornar-se o momento central do sexo, extirpando a ideia do egoísmo solipsista. Quanto mais me toco, digamos mesmo, quanto mais me masturbo, mais eu amo meu parceiro, que recebe os estímulos que me dou, mais eu amo e me transfiguro nele ou nela e vice-versa.[22]

O internauta poderá “inventar” na realidade virtual um(a) parceiro(a) de acordo com seu gosto, remodelar seu corpo à vontade, usando programas apropriados, colocá-lo na memória e deixá-lo à disposição, ou então modificar sua forma e aparência conforme seu humor. Dentro de alguns anos, bastará conectar-se no ciberespaço, munido de uma combinação de estímulos sensoriais, dando ao Outro as informações desejadas sobre uma identidade que pode ser eternamente modificada, obtida a partir de um imenso compartimento de fantasias. Bastará clicar em uma ou outra parte do ícone que simboliza o parceiro para que o estímulo virtual seja sentido. No limite, a criatura pode perfeitamente ser um programa determinado, a sensação será a mesma. Programas registrarão as experiências sexuais vividas por outros, incluindo celebridades e personalidades públicas, e oferecerão aos usuários como que uma sexualidade própria, repleta de curiosidades, que lhes permita pôr-se na pele do outro. As identidades sexuais se dissolvem, pois ninguém mais tem certeza do sexo ou da aparência do parceiro do outro lado da tela, e cada um pode assumir inúmeras definições provisórias de si, conforme as circunstâncias. Com uma identidade de modulação variável, o ciberespaço permite um eterno Carnaval, levando ao extremo a lógica da máscara. Uma vez dissimulado o rosto, tudo é possível. Não há mais o perigo de poder ser visto ou de prestar contas de seus atos, já que o Outro é igualmente imaterial. O interlocutor invisível é privado da possibilidade de olhar, para além de toda moral, e portanto destituído de julgamento. A presença mútua não passa de um feixe de informação desprovido de carne. O ciberespaço é um lugar privilegiado de experimentação, sem o risco de doenças sexualmente transmissíveis, uma busca que satisfaça alguns dos gostos do indivíduo, no espelho telemático que os conhece mais que ele. Sua verdade interior está contida na feliz conexão que, subitamente, o revela a si mesmo. Segundo Helena Velena, o cibersexo é uma

psicanálise alternativa, horizontal e democrática, em que os usuários podem se despojar da couraça de seu caráter sem temer o julgamento dos outros, sem que ninguém mais pense em rir de seu sexo muito pequeno ou torto, ou que não se levanta no momento desejado, evitando assim que tenha de evocar as desculpas clássicas do estresse, da mulher em casa, das contas a pagar ou do filho que tirou uma nota ruim na escola.[23]

Eliminar concretamente o corpo da sexualidade é o melhor meio de impedi-lo de prejudicar a sexualidade. Com efeito, o contato exige sairmos de nossa reserva pessoal, nos submetermos à prova do corpo e nos confrontarmos com uma alteridade complicada, que eventualmente traz consigo perigo físico ou moral. O único risco do cibersexo é o de um curto-circuito nos dispositivos ou de um fio desencapado nos vibradores.

No cibersexo, o Outro é afastado em detrimento dos signos de sua presença. Pura imagem, alimentada por um banco de dados que produz o sentimento do real, a sexualidade telemática inventa uma dimensão elegante e pós-moderna do onanismo, fazendo da imagem mental um resíduo arcaico que beneficia a simulação, isto é, um lugar-fora, nem mental nem real, mas que é ambos ao mesmo tempo. Relação autista com a sexualidade, ofuscamento do corpo e do Outro desejável em proveito de um jogo de signos. Pode-se imaginar que, no futuro, muitos indivíduos terão em seus computadores programas sexuais personalizados, a fim de viver uma sexualidade sem risco de contaminação com o Outro, nestes tempos de Aids e de higiene.

Para o escritor de ficção científica A. C. Clarke, “o sexo tal como o praticamos hoje não mais existirá dentro de setenta anos”.[24] Ballard vai mais longe: “Creio que a sexualidade orgânica, corpo a corpo, pele contra pele, não é mais possível, simplesmente porque nada pode ter a menor significação para nós fora dos valores e das experiências da paisagem tecnomidiática”.[25] A Aids reforçou o desprezo pelo corpo, fazendo deste um lugar perigoso ou pelo menos suspeito. A América contemporânea vive uma volta ao puritanismo e manifesta, às vezes abertamente, uma aversão ou um incômodo profundo diante da sexualidade. “Existe o medo de pegar Aids, e também o medo do sexo, simplesmente, medo de qualquer coisa que se assemelhe a paixão, a sedução, a responsabilidade.”[26] Obsessivamente, o incômodo diante do sexo que se introduz na América leva a um formidável recuo da “liberação” sexual dos anos 60. A sexualidade é vista como um comportamento bestial. “São os macacos que fazem amor. É um comportamento animal”, diz Lucien Sfesz, citando uma frase que ele ouviu muitas vezes nos Estados Unidos.[27] Mesmo Timothy Leary, que no passado teve envolvimento direto com o movimento americano de liberação sexual, pensa que, “para muitas pessoas, o cibersexo — o fato de usar um telefone ou um PC para estimular o cérebro — é bem mais prático do que correr em todas as direções como um robô excitado, ter de despir-se e vestir-se novamente, dividir a cama com estranhos”.[28] O puritanismo une-se ao mito da saúde perfeita. A sexualidade sem corpo do ciberespaço abole todo risco de contaminação sem nada tirar do conforto da vida pessoal: não há mais necessidade de sair de casa e defrontar-se com os imprevistos da sedução e dos encontros. Daqui para a frente, o corpo do Outro será um disquete, um arquivo do disco rígido, um site na internet ou um CD-rom interativo.

IRONIA DO CORPO

O discurso sobre o fim do corpo é um discurso religioso que crê no advento do Reino dos Céus. No mundo gnóstico do ódio ao corpo que é antecipado por parte da cultura virtual, o paraíso é necessariamente um mundo sem corpo, equipado de chips eletrônicos e de modificações genéticas ou morfológicas.[29] Certamente, continuamos a ser carne. Neste texto exploramos discursos de representações, utopias e às vezes de um mundo que começa a tornar-se real, um mundo finalmente liberto do mal que, para muitos desses pesquisadores, é o corpo. Mas o sensível permanece. Essa visão do mundo, que isola o corpo, hipostasia o espírito e eleva o homem a uma hipótese secundária e certamente negligenciável, confronta-se hoje com a resistência da sociedade e um questionamento ético generalizado. Se o homem só existe por meio das formas corporais que o colocam no mundo, qualquer modificação de sua forma implica uma outra definição de sua humanidade. Se as fronteiras do homem são traçadas pela carne que o compõe, suprimir ou acrescentar componentes modifica a identidade pessoal que é própria ao homem e suas referências aos olhos dos outros. Em suma, se o corpo é um símbolo da sociedade, como sugere Mary Douglas,[30] toda modificação em sua forma afeta simbolicamente o vínculo social. Os limites do corpo desenham, em sua escala, a ordem moral e significante do mundo. Pensar o corpo é uma outra maneira de pensar o mundo e o vínculo social: uma desordem introduzida na configuração do corpo é uma desordem introduzida na coerência do mundo. Se o corpo não é mais a pessoa, se ele está cada vez mais distante de um indivíduo de estatuto cada vez mais indecidível, se o dualismo não se inscreve mais na metafísica, mas decide o concreto da existência e funciona como um modelo de correntes múltiplas da tecnociência ou da cibercultura, então toda a antropologia ocidental, e todo o humanismo implícito e explícito que ela sustentava, são postos em questão.

Tradução de Paulo Neves

Notas

[1] Retomo neste artigo a temática de meu livro L’adieu au corps (Paris: Métailié, 1999). Ver igualmente Anthropologie du corps et modernité (5ª ed. Paris: PUF, 2000).

[2] William Gibson, Neuromancer. Nova York: Ace Books, 1984 (edição francesa: Neuromancien. Paris: J’ai lu, 1985, p. 7).

[3] M. Heim, “The erotic ontology of cyberspace”, in Michael Benedikt, Cyberspace, first steps. Cambridge, Mass.: The MIT Press, 1991, p. 64.

[4] M. Morse, “What do cyborgs eat?”, in Gretchen Bender & Timothy Druckrey, Culture on the brink, ideologies of technology. Seattle: Bay Press, 1994, p. 162.

[5] Bruce Mazlich, The fourth discontinuity the co-evolution of humans and machines. New Haven: Yale University Press, 1993, p. 220.

[6] Os depoimentos de Minsky e de Stelarc são tirados de um apaixonante dossiê da revista Whole Earth Review, n. 63, 1985: “Is the body obsolete?”.

[7] Timothy Leary, Chaos & cyber culture. Berkeley: Ronin Pub., 1994 (edição francesa: Chaos et cyberculture. Paris: Editions du Lézard, 1996, p. 218).

[8] Hans P. Moravec, Mind children; the future of robot and human intelligence. Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1988 (edição francesa: Une vie après la vie. Paris: Jacob, 1992, p. 11).

[9] Ibid., p. 7.

[10] Ibid., p. 8.

[11] Ibid., p. 9.

[12] Douglas Coupland, Microserfs. Nova York: ReganBooks, 1995 (edição francesa: Microserfs. Paris: 10-18, 1996, pp. 364 ss).

[13] Ver David Le Breton, Du silence, essai. Paris: Métailié, 1997.

[14] Mark Dery, Escape velocity, cyberculture at the end of the century. Nova York: Grove Press, 1996 (edição francesa: Vitesse virtuelle, la cyberculture aujourd’hui. Paris: Abbeville, 1997, p. 312).

[15] Scott Bukatman, Terminal identity the virtual subject in postmodern science fiction. Durham: Duke University Press, 1993, pp. 208-9.

[16] David Le Breton, Des visages; essai d’anthropologie. Paris: Métailié, 1992.

[17] Sherry Turkle, Life on the screen; identity in the age of the Internet. Nova York: Touchstone Edition, 1997, p. 14.

[18] Timothy Leary, op. cit., pp. 22-3.

[19] Sherry Turkic, op. cit., p. 21.

[20] Ibid., p. 211.

[21] Helena Velena, Dal cybersex al transgender, tecnologie, identità, e politiche di liberazione. Roma: Castelvecchi, 1995, p. 149.

[22] Ibid., p. 157.

[23] Ibid., p. 197.

[24] Le Courrier International, 16 dez. 1993.

[25] Mark Dery, op. cit., p. 204.

[26] Jean Baudrillard, Le paroxysme indifferent. Paris: Grasset, 1997, p. 133.

[27] Lucien Sfez, La santé parfaite; critique d’une nouvelle utopie. Paris: Editions du Seuil, 1995, p. 66 e p. 312.

[28] Timothy Leary, op. cit., p. 170.

[29] David Le Breton, L’adieu au corps, op. cit.; sobre os aspectos religiosos da internet, ver também Philippe Breton, Le culte de l’Internet. Paris, La Découverte, 2000.

[30] Mary Douglas, Purity and danger, an analysis of concepts of pollution and taboo. Londres: Routledge and K. Paul, 1966 (edição francesa: De la souillure. Paris: Maspero, 1984).

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