1994

Poética do pensamento

por Benedito Nunes

Resumo

Nietzsche, Freud e Marx, segundo Foucault, fundaram a hermenêutica moderna em que o ato interpretativo tende a prolongar-se indefinidamente, à falta de um fundamento último. Heidegger também faz da interpretação o problema principal do pensamento, mas vai propor, a partir de Ser e Tempo, o que é um escândalo para os filósofos sistemáticos: um pensar poético que “abre o mundo e a terra”. Por trás dessa aparente obscuridade delineia-se não só o caráter circular e histórico da interpretação (não há compreensão de si sem compreensão dos outros e do mundo), mas sua crítica à ideia de verdade como adequação e ao que ele chama de “esquecimento do ser”. O que lhe importa, ao falar de um templo grego ou do quadro As botas de Van Gogh em “A origem da obra de arte”, é restituir um espaço de abertura que se perdeu no regime normativo da Estética e na própria coisificação da arte como mercadoria. Arte é velamento e desvelamento, é doação de sentido. O poeta nomeia o sagrado e a poesia-canto “funda o que permanece”, como disse Holderlin, resistindo assim ao niilismo contemporâneo. Diante da crise dos fundamentos que afeta a arte desde as vanguardas do século XX, a hermenêutica heideggeriana acentua a necessidade da interrogação dubitativa e não ignora o caráter histórico da arte. No epílogo do ensaio citado, ele responde a Hegel, que já anunciava a “morte da arte”, dizendo que ela é risco e perigo. O pensamento deve acolher a gratuidade do ser e substituir o conhecimento teórico por um diálogo com a poesia.


Richard Rorty distribui em duas famílias os filósofos do nosso tempo: a dos sistemáticos, que tem por único objetivo estabelecer os princípios do conhecimento teórico ou pelo menos um rol de verdades universais aceitáveis, e a dos “edificantes”, que rejeita a importância exclusiva desse objetivo, suprindo-o com a finalidade pedagógica de ajustar o homem a outros tipos de experiência e pensamento.[1] Talvez formem os sistemáticos, praticantes da epistemologia e seus afins, a família mais velha das abelhas do  “mel do espírito”, coletoras do conhecimento, aquela que a despeito desse irônico apelido com que Nietzsche a batizou, contribuiu para firmar a carta de identidade da Filosofia. Mais novos, os outros, que a leve ironia de Rorty chama de “edificantes”, reativos em vez de construtivos, e por isso trabalhando numa certa dependência do que os mais velhos construíram tal como os céticos da Antiguidade trabalharam à sombra de Platão e Aristóteles —, seriam um tanto marginais à tradição filosófica que interrompem ao interpretá-la e a que os últimos dão continuidade. Quando concebeu a fenomenologia como a ciência da ciência, destinada a assegurar o infinito esforço de fundamentação do conhecimento, Edmund Husserl terá sido um dos derradeiros sistemáticos. Heterogênea, a lista dos não-sistemáticos inclui de Santayana a Dewey, do segundo Wittgenstein a Heidegger, todos ou quase todos de certa maneira hermeneutas, enquanto críticos do conhecimento teórico, inclinados a recuperar para o pensamento filosófico as formas de experiência, dele excluídas tradicionalmente: a prática da vida cotidiana e a imaginária da arte e da poesia. Na verdade, sem prejuízo das aproximações e entrelaçamentos das duas grandes famílias, a Filosofia, tal como hoje se apresenta, é ou hermenêutica ou epistemológica.

Os hermeneutas não negam a validade do conhecimento teórico. Mas ao descartar-lhe a importância exclusiva, fazem-no argumentando que o fundamento de seus princípios recorre a pressuposições inaclaradas a respeito da realidade e do homem: uma delas é a natureza tangível do real, objeto de representação, como matéria de enunciados verdadeiros, outra é a autonomia do homem, com razão ou espírito, apto a captar, no espelho dos conceitos, a essência transparente da realidade. O homem mesmo, segundo a metáfora dessa pressuposição que Rorty prefere, é um cristal, análogo à transparência nele refletida. Daí a conceituação tradicional da verdade, adaequatío rei et intellectus (adequação da inteligência à coisa, que a crítica de Heidegger abala em Ser e tempo (1927), depois de contestar a primazia do conhecimento teórico. Longe de originário, o conhecimento teórico deriva da interpretação, como experiência incontornável do homem enquanto ser-no-mundo, o que tem a ver com a tarefa de sua “edificação” pela Filosofia.

Num famoso artigo do final da década de 60, “Nietzsche, Freud, Marx”,[2] Michel Foucault mostrou que esses pensadores, revolucionando a interpretação da cultura, do indivíduo e da sociedade, fundaram a hermenêutica moderna, em que o ato interpretativo, enredando o próprio intérprete, tende a prolongar-se indefinidamente, à falta de um fundamento último. Pelo mesmo motivo, o intérprete não pode executar esse ato incômodo sem que ao mesmo tempo se interprete. De tal incômodo compartilha a hermenêutica elaborada por Heidegger, cujo nome eu acrescentaria aos de Nietzsche, Freud e Marx.

Como hermenêutica, a filosofia de Heidegger, na medida em que tomou para seu tema a questão do sentido do ser, abordada no retumbante e inacabado livro de 1927, Ser e tempo, fez da interpretação o problema número um do pensamento. O exame desse problema constitui, a meu ver, o indispensável prólogo à leitura de “A origem da obra de arte”, escrito heideggeriano da segunda fase — ou do último Heidegger, como se costuma dizer — que centraliza esta minha tentativa de reflexão sobre a experiência pensante da arte e da poesia nesse filósofo. Lido independentemente da prioridade, que se dá desde o primeiro Heidegger, desde o Heidegger de Ser e tempo, da

interpretação sobre o conhecimento propriamente dito e de suas implicações, “A origem da obra de arte” pode parecer um texto insidioso, se não abstruso.

Tal como aí se enuncia, a obra de arte é um acontecer da verdade, o que sugere um retorno à tradição do classicismo, que harmonizou a arte com a verdade, através da bela imitação da natureza, ou uma retomada da intuição romântica, que igualou o belo artístico à verdade. Mas tanto num caso quanto noutro, admite-se que a arte expressa a verdade, racional para os clássicos, supra-racional para os românticos, mas não que seja o seu acontecer. Ao sentido equívoco desse enunciado junta-se a obscuridade de outros. Como entender que a origem da arte não é o artista, e que na obra trava-se o embate entre o mundo e a terra aos quais ela nos abre? O que significa que a obra de arte abre o mundo e a terra? Por outro lado, muito do que há de obscuro ou resvaladiço nesse texto, originariamente uma conferência pronunciada em 1935, decorre da circunstância de que ele é, no conjunto da obra heideggeriana, o fragmento de uma interpretação da época moderna.

Além disso, “A origem da obra de arte”, de que outra conferência do mesmo período, “Hölderlin e a essência da poesia” (1936), é o complemento, já delineia, em sua própria interpretação da arte e da poesia, um pensar poético (dichtende Denken), total escândalo para a família dos sistemáticos em oposição crítica à tradição metafísica da Filosofia em fase de superação. De qualquer forma, a verdade enquanto acontecer, que prevalece nos dois escritos, constitui a noção dominante, diretiva, desse pensamento que foi esboçado na primeira fase, em Ser e tempo, sob a prioridade da interpretação a que anteriormente me referi. Forçoso se torna, pois, que recorra a esse livro para esclarecer a mudança por que passou, sob o foco da questão do ser, a ideia filosófica tradicional da verdade, e como para isso contribuiu o problema da interpretação.

Seja o que for que interpretemos, uma obra de arte, uma peça judiciária, um texto literário, histórico ou religioso, não há interpretação sem prévia compreensão do sentido daquilo que nos propomos a entender. Esse postulado da Hermenêutica, enquanto técnica ou arte de exegese, fundamenta-se no princípio da contextualidade, ou seja, na correlação entre o sentido das partes e o sentido do todo daquilo que se interpreta: o entendimento prévio deste esclarece aquelas, e vice-versa, o entendimento das partes esclarece o todo. A interpretação é, pois, circular, implicando um movimento de vai-e-vem das partes ao todo previamente compreendido: o intérprete, que não pode, por assim dizer, sobrevoar o compreendido, trabalha dentro de um círculo — o círculo hermenêutico, onde já se encontra quando inicia a exegese e do qual não sai quando a termina; os conceitos elaborados no curso da interpretação retificam, ampliam ou corrigem, em benefício do correto entendimento do sentido, a compreensão liminar da qual se partiu. Se, como diz Foucault, os intérpretes também são interpretados pelas suas próprias técnicas de interpretação, então o interpretans se reconhece no interpretandum. Toda interpretação envolve, portanto, uma preliminar e antecipada autocompreensão do intérprete. Mas, e aqui efetuamos uma transição para a hermenêutica heideggeriana, como filosofia da interpretação, sob o aspecto da questão ontológica, do tema do sentido do ser que a identifica, não há compreensão de si sem compreensão dos outros e do mundo; e compreender-se compreendendo o mundo desta ou daquela forma, assim podendo o homem responder a diferentes situações interpretativas, seja como interlocutor, seja como exegeta ou crítico, pressupõe que o intérprete já compreende o ser, de maneira vaga e indeterminada. A partir daqui o problema hermenêutico, relativo ao prévio compreender do sentido que as técnicas de interpretação reclamam, passa ao plano da mais extrema generalidade — ao plano ontológico, que extrapola da atitude interpretativa para o ser de quem interpreta. Por outras palavras, a compreensão do ser, que também antecipa não só nas formas de conhecimento científico e filosófico como em toda conduta humana, e que está implícita no uso da linguagem, apenas particulariza para o hermeneuta a situação interpretativa comum em que todos vivemos.

Sob esse foco, a compreensão do ser, manifesta em tudo quanto pensamos, enunciamos, expressamos ou fazemos, é o que distingue o homem como Dasein, isto é, como aquele ente que existe compreendendo o ser, e que pode, por isso, interpretar de uma certa maneira a si mesmo e ao mundo, co-assumido nessa compreensão. A questão do sentido do ser em geral foi colocada pela primeira vez no livro de 1927 — Ser e tempo[3] em caráter preparatório, do ponto de vista da interpretação do Dasein por si mesmo, como objeto de uma Analítica, ou seja, de uma análise fenomenológica, que consiste em explicitar, sob a perspectiva prática da vida diária, aquilo que subjaz implícito e encoberto nessa mesma interpretação. Vamos deixar de lado, em proveito do nosso assunto, quer as motivações filosóficas imediatas da questão — como o pressuposto do ser nas categorias e no sujeito transcendental omitido pela Teoria do Conhecimento e mesmo pela Fenomenologia husserliana que a prolongou — quer o assentamento do método da Analítica, que tomando a Fenomenologia husserliana como Ontologia reverteu a intuição fenomenológica das essências num acesso imediato, numa abertura (Erschlossenheit) ao ser. Mas será preciso ressaltar que o sentido explicitado da conduta do Dasein tem sempre o caráter de ser desse ente, e que os conceitos analíticos correspondentes, de teor ontológico — ser-no-mundo, ser-com-os-outros, a disposição afetiva do existir fáctico (Befindlichkeit), o compreender projetivo (Verstehen), a imersão no cotidiano (Verfallen, “queda”), como dimensões de abertura, o cuidado (Sorge), como estrutura significacional do Dasein, e a morte como sua mais extrema possibilidade (Sem n zum Tode) são pré-teóricos e não representacionais. Voltado para a existência enquanto possibilidade sua, o Dasein, fugindo à morte e transcendendo-se na direção do mundo, não é um cristal transparente. E por isso, a Analítica se desenvolve de encontro à propensão ao encobrimento desse ente, cuja existência oscila entre o autêntico e o inautêntico, entre a decisão de reconhecer-se um poder-ser e a decisão de encobri-lo, interpretando-se como fato tangível, à semelhança dos entes intramundanos que o rodeiam. Essa oscilação, que é o aspecto existencial, “edificante, da Analítica, incorpora-se ao trabalho de explicitação fenomenológica. Mas devemos focalizar especialmente o último desencobrimento que ela efetua — a temporalidade autêntica, o tempo originário, sentido do ser do Dasein, antes de voltarmos ao círculo hermenêutico antes referido.

Se o Dasein é poder-ser e se a morte é o horizonte negativo dessa possibilidade, que a totaliza pondo-lhe termo, então a existência é sempre movimento extático, ou seja, um sair de si mesma (futuro), que volta a si, à situação fáctica em que se encontra (passado) e imerge no meio dos entes com os quais se defronta (presente). Correlação recíproca entre as três dimensões — futuro, passado e presente, enquanto êxtases do Dasein , a temporalidade, sentido do ser desse ente, é a nossa condição própria. Ser humano é ser temporal. Por isso, a temporalidade é não só a condição da possibilidade de representar as várias modalidades do tempo, como também a condição de possibilidade da compreensão do ser. Temporalidade significa igualmente o caráter histórico do Dasein, o acontecer de sua existência, embrionário no futuro e passado persistindo no presente. Daí a finitude do homem, mortal e sem fundamento último, metafísico ou teológico. Finito é ainda o estado de congênita incompletude do conhecimento humano; a autonomia do sujeito cognoscente funda-se numa atitude derivada do compreender, temporal e histórico. Dependendo da abertura que a ele se antecipa e da temporalidade que o limita, o conhecimento teórico não é infinito. Confirma-o a prioridade da interpretação. Na perspectiva prática da vida diária, com a qual Heidegger contornou pelo agir, e portanto mediante uma angulação pragmática se não pragmatista, a precedência do teórico sobre o prático, premissa das filosofias epistemológicas, em vez de confrontar-nos de imediato com coisas ou com objetos, existimos compreendendo de antemão aquilo com que lidamos: antes de se nos apresentarem como seres determinados, mesmo as coisas chamadas naturais ou artificiais são, para nós, antes de tudo, entes disponíveis, instrumentais, no mundo circundante. A camponesa, dir-nos-á Heidegger em “A origem da obra de arte”, a propósito das botas no quadro de Van Gogh que aí é examinado, não se apercebe delas quando as usa. Essa visão prática adere à utilização e ao mundo, o contexto prático do utensílio ou instrumento. E mesmo o quadro, “pendurado à parede como uma espingarda de caça ou um chapéu”, e que se pode, à semelhança de uma simples coisa despachar, embalado, de exposição a exposição, é um utensílio produzido, “fabricado pela mão do homem”.[4] Porém, ele se reveste do estatuto singular de obra, a meio caminho entre a coisa natural e o produto. Exemplificando a aderência do utensílio ao mundo, o quadro, ao qual voltaremos depois, facilita-nos a passagem à interpretação.

O aperceber-se das botas como botas tal objeto, feito de couro etc; destacada da mesma compreensão anterior, é uma visão interpretativa abrindo-nos a um ente determinado, independentemente do ato de predicar e do enunciado proposicional, ambos constitutivos do conhecimento teórico. Não predicaríamos, enunciando isto ou aquilo de um estado-coisas, e portanto conhecendo-o enquanto objeto, se o ente já não estivesse previamente aberto. Assim, a precedência da interpretação sobre o conhecimento implica que a verdade do enunciado — adaequatio rei et intellectus — deriva de uma verdade originária, no sentido de desvelamento ou desocultamento do ente — sentido concordante com o significado da palavra grega alétheia, usada pelos pré-socráticos, e que Heidegger passará a empregar; a verdade do Dasein, como ser-no-mundo, conexa à abertura. Mas atente-se para o fato de que a prioridade da interpretação resulta do quadro referencial em que ela opera — razão de ser do princípio de contextualidade da técnica hermenêutica: a visão interpretativa apoia-se num dado que já compreendemos e concebe-o previamente como algo, isto ou aquilo, dentro do mundo, o contexto em que nos situamos. E a concepção, de acordo com o antimentalismo da angulação pragmatista adotada, se esboça discursivamente na linguagem comum da vida diária. Reencontramos aqui, mas no plano discursivo ausente da prática, a circularidade hermenêutica entre parte e todo que agora podemos qualificar de temporal. Não será fora de propósito resumir da seguinte maneira a prioridade da interpretação de que falamos no início: ao interpretar, articulamos discursivamente o que compreendemos, e o que compreendemos, neste momento, compreendemo-lo temporalmente, tanto prospectiva quanto retrospectivamente, à luz do passado que permanece no presente e do futuro
que naquele se projeta. O círculo hermenêutico é, portanto, um círculo histórico-discursivo.

Seguem-se daí outras implicações encadeadas da temporalidade a que daremos essa conclusão. Primeiramente, a temporalidade é a chave hermenêutica da compreensão do ente enquanto ente — a oúsia, como objeto superior de conhecimento da disciplina por excelência da Filosofia, a Metafísica geral (Ontologia), que fixou a interpretação do ser desde a Filosofia clássica dos gregos (Platão e Aristóteles), passando à Escolástica medieval e depois a Descartes. Permanente, imutável, e assim presença para a intuição racional, o ser nessa intepretação que esquece a diferença que o separa do ente, recai debaixo de uma só das três dimensões do tempo, o presente. Sua dominância histórica se confunde com a de Metafísica, que perpetuou tal esquecimento. Mas graças ao desvendarnento de que a presentificação responde pela dominância do ente, pôde Heidegger praticar uma “destruição” da História da Ontologia, para, numa busca retrospectiva das fontes originárias, desencobrir a primeira compreensão do ser, a physis dos pré-socráticos, soterrada pela concepção entitativa que vigorou historicamente. Ora, essas fontes originárias são textuais: os fragmentos de Anaximandro, Heráclito e Parmênides, sobretudo, em cujas palavras e frases, e portanto na língua grega em que foram escritos, o hermeneuta vai surpreender uma compreensão do ser mais primitiva — que não desaparecerá de todo na Filosofia clássica antiga, mas que será por ela recalcada. Ter-se-á que admitir, então, a abertura daqueles pensadores para essa mesma compreensão na língua em que escreveram os seus textos e que as retransmitiu ao intérprete tradutor.

Se é certa, conforme vimos anteriormente, a direção retrospectiva da interpretação em geral, não é menos certa, pelo que acabamos de expor, a inversa direção prospectiva, do passado ao presente, em que redunda tanto o vigor histórico, da concepção entitativa quanto o remanente vislumbre nos textos dos pré-socráticos da diferença entre o ser e o ente que a Metafísica esqueceu. Ambos, portanto, se nos antecipam na linguagem, a primeira já determinando-nos o pensamento, na medida do penetrante influxo da Metafísica, e o segundo, ainda não inteiramente pensado, reclamando um retorno à origem como sua tarefa atual e futura. São duas linhas distintas de uma mesma história a deslindar. Eis por que, em sua segunda fase, Heidegger abandonará a perspectiva prática da vida diária e a Analítica do Dasein pela da linguagem dos textos, suporte não só da destruição” da História da Ontologia, como da reconstrução desta numa História única — a História dos encobrimentos e descobrimentos do ser, em variações históricas diversas — na Antiguidade, o eidos platônico, a forma determinativa da matéria, além da substância aristotélica (oúsia), composto de matéria e forma, que assimiladas foram ao ente do Criador e da criatura na teologia do Medievo, e na Época Moderna, o sujeito, a consciência de si, carreando todas a mesma concepção entitativa.

Porém, do ponto de vista dessa história única do ser, que excede as previsões e decisões humanas, a verdade originária, alétheia, tanto velamento quanto desvelamento, antes verdade do Dasein, sujeita à propensão deste ente para cair na existência inautêntica, e consequentemente oscilando entre o verdadeiro e o não-verdadeiro, é, nessa segunda fase, verdade do ser, que acontece, advém, temporalmente. Dizer que a compreensão do ser se antecipa ao intérprete já significa, nesse passo, que ela determina a situação interpretativa da época em que ele se encontra, dentro da qual igualmente comensura as diretivas do conhecimento teórico, as decisões práticas e o destinamento individual e coletivo do Dasein. Mas como a História do ser é concomitantemente a História de seu olvido, ela também desenrolaria, como um contraponto à dominância do ente, a partir da origem, aquela linha ainda emergente, não completamente pensada do ser esquecido, linha de um pensamento não representacional, e por isso poético, dichtende Denken, que aflora do dizer dos pré-socráticos, de que o filósofo se tornaria o exegeta, no sentido eminente de tradutor das palavras gregas essenciais (alétheia, logos, physis). Mas se esse pensamento emergente é poético, ele também virá a fundo na poesia e na arte, que teriam sido, em cada época, à margem da Filosofia, os irruptivos pontos de afloramento da mesma verdade olvidada na forma representacional de pensar.

Dado, pois, o alcance ontológico que dessa maneira se confere à poesia e à arte, e já esclarecida a mudança da noção de verdade a passagem da adaequatio à alétheia — e de como para isso contribuiu a prioridade da interpretação, tanto na primeira quanto na segunda fase da Filosofia de Heidegger, não parecerá tão equívoca quanto a princípio a ideia de que a arte é um acontecer da verdade. Mas por que, segundo o enunciado completo da tese de “A origem da obra de arte”, a verdade acontece na arte fazendo-se obra? Origem diz respeito à verdade originária, ao vínculo da obra com a primeira compreensão do ser realçada nas descrições de um quadro de Van Gogh (As botas) e de um templo grego, provavelmente o de Posêidon, em Paestum, que formam o núcleo fenornenológico desse escrito. Assim, pois, sob a aparência de uma abstrusa Filosofia da arte, a conferência de 1935 é, do mesmo modo que Hôlderlin e a essência da poesia, um capítulo da História do ser, legível segundo as duas direções interpretativas a que já aludimos — a retrospectiva, do presente ao passado, da Epoca Moderna, em que se situa o intérprete, a Grécia antiga, e a prospectiva, do passado ao presente, de volta à mesma Época Moderna, marco referencial hermenêutico da História do ser. A descrição daquelas obras artísticas prolonga o efeito da “destruição” da História da Ontologia numa “destruição da Estética”, conforme adiante se verá.

O quadro de Van Gogh é uma obra figurativa moderna, pertencente ao acervo de um museu e assinada pelo artista; o templo grego é uma obra não figurativa da Antiguidade, de autoria anônima, existente em estado de ruína em determinado local da Magna Grécia (Sul da Itália), hoje ponto de visitação turística. Mesmo arruinado, o templo tem identidade, como identidade tem o quadro. Se os considerarmos abstratamente, à distância, ambos oferecem a consistência material de coisas, localizadas no espaço, à semelhança de qualquer ser natural. No entanto, segundo a incidental observação da parte anterior sobre o quadro de Van Gogh, o templo, enquanto obra, também oscila entre a coisa natural e o produto. Não é inteiramente real (real vem de res, “coisa” em latim) nem é, inteiramente, um utensílio manipulável. Mas quando me aproximo do quadro de Van Gogh, não vejo cores numa superfície emoldurada e nem a simples representação da bota. Numa espécie de visão prática, aderente ao mundo, ao contexto, vejo a “fadiga do rude labor campesino”…, “a terra adubada e úmida” muda inquietude do ganha-pão”.[5] E posso ver tudo isso, olhando o quadro, porque minha visão está sendo dirigida pelo ser do utensílio que a obra me descerra. Sem dúvida que esta descrição é paradoxal: ela incide sobre o percebido, e entretanto me dá, em vez de um objeto, o ente não representável aberto na obra, sob o foco da qual minha visão recaiu. Entramos, também aqui, num círculo hermenêutico, por força do envolvimento daquilo que me revela o quadro como obra.

Não é, pois, a simples relação entre sujeito e objeto que se estabelece entre mim e a obra, mas uma relação participante, de envolvimento num contexto, mais clara na descrição do templo: a instalação sobre uma rocha, seu pórtico cercando o recinto que sacraliza a estátua do deus, congregam caminhos, realçam a luminosidade do dia, as ondas do mar no fundo, “a árvore e a erva, a águia e o touro, a serpente e a cigarra”.[6] O templo e o quadro descerram o espaço erigido em ambos, e em ambos descerrando uma rede de correlações humanas, contextuais, que no último converge para o ser do utensílio, naquele para a divindade votiva. Um mundo se abre no que o quadro e o templo erigem e descerram. No primeiro abre-se através do sombrio empastado das cores, no segundo abre-se através da dureza da pedra. Enquanto coisa ou produto, deixando aparecer na matéria a terra, o que não é propriamente humano, e de encontro à qual o mundo se abre, a obra suprime-se naquilo que mostra. “A obra move a própria terra para o aberto de um mundo e nele a mantém.”[7]

Nos dois casos, a descrição opera uma série de deslocamentos conceptuais. Em primeiro lugar, o mundo aberto não está no espaço, mas circunscreve o espaço. O templo e o quadro produziram-se produzindo o espaço, a partir da matéria realçada em ambos, independentemente de uma forma ordenadora: o templo salienta a dureza da pedra como pedra, o quadro salienta as cores como cores. Além de haver desconectado a obra de Van Gogh e a do anônimo arquiteto grego da História da Arte, a descrição fenomenológica desconstruiu a matéria e forma, o par de conceitos exportado da compreensão metafísica do ser para a Estética. Mas esse primeiro resultado da “destruição” da Estética se completa pela mudança da posição tradicional, tanto do artista quanto do destinatário da obra, a qual, com a sua correlata materialidade, exige agora o espaço de abertura, substituindo a função ordenadora da forma sobre a matéria. E essa mudança só pode ser corretamente avaliada mediante a interpetração da Época Moderna, marco referencial da História do ser, do qual “A origem da obra de arte” é um capítulo ou um fragmento.

A Época Moderna é a época da entrada da arte “no horizonte da Estética”[8] o período em que a arte passa a ser compreendida e praticada esteticamente. Isso não significa apenas que desde os meados do século XVIII se impusesse para as obras artísticas o regime normativo da disciplina filosófica relativa ao estudo dos princípios do belo aplicados à arte, que recebeu de Baumgarten o nome de Estética (1775), e muito menos significa que só a partir desse momento tivesse começado o relacionamento do artístico com a esfera do sensível (aisthesis) através da beleza e do prazer por ela proporcionado. Os gregos distinguiram vários tipos de beleza, termo aplicado tanto às coisas e aos objetos fabricados quanto à alma e às virtudes. Platão e Aristóteles relacionaram o belo (kallós) sensível com o que na arte agrada a vista e é digno de admiração. Contudo, na Antiguidade, o belo nunca foi um domínio congênito ao artístico, e no Medievo chegou a denominar o esplendor divino. Nessas duas épocas não terá faltado a apreciação das obras, segundo o fim a que se se destinavam e a espécie de beleza a que deviam servir. Mas essa apreciação subordinar-se-ia do final do século )(VIII em diante ao juízo de gosto estético, fundamentado por Kant em sua Crítica da faculdade de julgar (1790). Assim, dependentes do sentimento, o belo e a arte tornavam-se objeto de fruição individual.

No entanto, não é a Kant que se deve nem o regime normativo da Estética nem a sua dominância sobre a compreensão e a prática da arte. Naquela obra, a terceira Crítica, Kant defrontava-se com o problema consequente à Crítica da razão pura (1781) e à Crítica da razão prática (1788): estabelecer a ponte entre os juízos teóricos, determinados por conceitos delimitativos da experiência, e os juízos práticos, determinados por fins racionais independentes da experiência. O juízo de gosto estético, de caráter não cognoscitivo, baseado no sentimento em vez de no conceito — o belo atribuído à natureza e à arte relacionado a uma satisfação desinteressada (ohne Interesse)–, seria essa ponte. Mas ainda na terceira Crítica, Kant recorria a outro fundamento para a arte, que o colocou a meio caminho entre o classicismo e o romantismo, ao qual forneceu um elemento teórico germinal: a imaginação própria do gênio, capaz de produzir artisticamente, o que significa produzir de tal modo que a obra resultante parecesse, afetando a espontaneidade da natureza, inventar a sua regra de gosto e transmitir uma intuição superior, supra-sensível, da realidade. Convertidos pelos românticos alemães (Schlegel, Novalis, Schelling) na capacidade de conhecimento específico da arte, por oposição à ciência, o gênio respaldou a transferência da produção artística do plano da mimese para o plano da criação. A obra nada imita do real, porque, espelho do Eu e de sua liberdade, introduziria na ordem causal da natueza um permanente elemento de novidade. Normalizada como termo técnico de rotina, a criação recobre o surto da expressão individual e da consequente reflexividade, daí por diante marcas distintivas da arte e da poesia. A origem da obra é o artista criador e seu destinatário o indivíduo apto a recebe la fruitivamente. Do artista ao destinatário estabelecia-se uma corrente vivencial.

Vê-se, portanto, que o regime normativo da Estética, enquanto disciplina filosófica, apenas externava o fenômeno da subjetivização generalizada, soberana, na apreciação do belo e na produção artística. “A obra de arte é colocada como ‘objeto’ para um ‘sujeito’”, comenta Heidegger. Essa consideração baseia-se na relação sujeito-objeto, fundamentalmente a relação sensível. A obra torna-se objeto sob o aspecto da experiência vivida (Erleben) de quem a contempla[9]? Correlativamente, o belo artístico, objeto de juízo estético, nem domínio do conhecimento nem interesse prático, alcançava, separado da ciência e da religião, autonomia de experiência vivida. Schiller poderia então considerá-lo uma elevada forma de aparência, sem realidade efetiva ou verdadeira; mas “nosso ato e nosso estado[10] a arte estética, arte do belo, deveria ser cultivada servindo de novo instrumento para a educação da humanidade. No entanto, a geral estetização das artes, niveladas pelo gosto, pelo valor fruitivo, concretizaria a pregação de Schiller. Com o advento dos museus, reuniram-se num só espaço obras desvinculadas de seus espaços próprios de surgimento, e já em meados do século XIX desvinculadas de culturas e civilizações extra-européias de onde procediam. A arte se unificava enquanto fenômeno de cultura estética.

Episódio da História do ser, a entrada da arte no horizonte da Estética” assinala, finalmente, o predomínio da variante moderna do ente, que ascendeu com o Cogito cartesiano, determinando a ascendência metafísica do sujeito pensante — interpretado por Descartes como substância, res cogitans — e de sua sensibilidade. Firmando-se na evidência do Eu, a verdade converte-se em certeza, adequação das ideias entre si, enquanto representação do real, de que o homem ocupa o centro como indivíduo. A esse novo fundamento remete o fenômeno paralelo ao da entrada da arte no horizonte da Estética”, que integra a configuração da Época Moderna: a unificação normativa do conhecimento teórico pela ciência físico-matemático da Natureza, modelo do saber organizado, quantitativo e previsor, a que se associará a transição da técnica à tecnologia. A verdade científica assegura ao indivíduo o seu posto central e a técnica lhe permite, numa confirmação do prognóstico de Descartes e Bacon, exercer progressivo controle sabre as coisas, dispondo, mediante previsão e cálculo, da totalidade do ente, alvo de exploração sistemática, extensiva à arte, submetida ao valor de troca no mercado.

Eis o marco referencial em que se enquadram o artista e o destinatário da obra na Época Moderna, quando a arte, na condição de bem cultural, ao mesmo tempo com o valor inestimável e circulando como mercadoria sujeita à lei concorrencial da compra e venda, gera, dentro do sistema de exploração sistemática que tudo se impõe, relações transacionais de produção, consumo e acumulação patrimonial (Kunstbetrieb), além daquelas de avaliação crítica e de levantamento histórico, propiciadas pela organização de coleções particulares, galerias comerciais e museus. As obras são

colocadas ao alcance da fruição artística pública e privada. Autoridades oficiais cuidam das obras e se ocupam de sua conservação. Críticos dé arte e conhecedores também tratam disso intensamente. O comércio dos objetos de arte provê o mercado. A História da arte transforma as obras em objetos de pesquisa científica. Mas no meio de toda essa atividade, ainda encontramos obras?[11]

Por certo que o quadro de Van Gogh só num museu pode ser encontrado, e o que ontem foi o templo grego é hoje uma ruína valorizando a paisagem turística onde os seus destroços avultam também ela, paisagem, um espaço museológico ao ar livre. No espaço museológico todas as obras se igualam, equivalentes que são de uma mesma atividade humana criadora, de que prestam testemunhos perduráveis, inclusive a ruína, signo do passado subsistindo no presente. Assim também o quadro de Van Gogh, peça do ateliê do artista, que daí terá emigrado, sem ornamentar a parede de uma residência burguesa, para museus e exposições itinerantes. Mas se deparamos com obras nas exposições, não encontramos mais o mundo a que pertenciam e a que deram acesso. Se esse raciocínio de Heidegger não se aplica completamente à pintura de Van Gogh, próxima de nós e testemunho de nosso tempo, sublinha, no entanto, o que perdemos ao ganhar a nivelação estética de todas as obras: a temporalidade da arte, em sua existência histórica efetiva, que resuma do discernimento do contexto nas duas descrições fenomenológicas anteriores em que me detive. O artista e o destinatário exigidos pelo espaço de abertura da obra abstraído pela consciência estética aparecem nessa dimensão recuperada à custa do duplo movimento temporal, retrospectivo e prospectivo da interpretação, desde o seu marco referencial, que circunscreveu aquelas mesmas descrições.

Em Verdade e método (1960), George Gadamer, discípulo de Heidegger, realçaria a dupla elisão da temporalidade e do espaço pela consciência estética. Sendo vivência pontual, momentânea do objeto, a consciência estética abstrai da obra a persistência de seu passado no presente, a continuidade de uma tradição que a trouxe até nós e que a ela nos liga.[12] E abstraindo a temporalidade, também abstrai, com o lugar de origem, o mundo próprio, que constitui a vigência histórica efetiva da obra. Na escala da História do ser, a arte, enquanto acontecer da verdade, efetua — e por isso tem vigência histórica efetiva possibilidades do Dasein, de
sua existência, que é tanto individual quanto comunal. “Cada vez que uma arte surge, isto é, quando há começo, um abalo [Stoss] se produz na História, que então se inicia ou começa de novo.[13] Esse iniciar ou novo começo (Anfang) se dá para um povo que a arte forma e que nela se reconhece. Três vezes teria isso acontecido — no mundo helênico, quando aflorou pela primeira vez o ente, no Medievo, quando se o interpretou como criatura, e na Época Moderna quando se tornou objeto de cálculo —[14] e de cada vez o ser irrompeu na obra como possibilidade de um povo, de seu Dasein histórico. Se é assim, o produzir da obra pelo artista, seja concebido à maneira de um fazer (techné) artesanal mimético, que reproduz um modelo previamente existente, ou à maneira do fazer espiritual do criador, está condicionado, tanto quanto a recepção da obra, à compreensão do ser que ela entreabre. Extrapolando do individual para o comunal e o público, sua vigência histórica responde pelo envolvimento afetivo do Dasein, a ela aderido numa atitude semelhante à proximidade às coisas da visão prática. É para o plano participativo desse envolvimento preliminar, que possibilita criação e recepção, e do qual o juízo estético é um derivado tardio, que se deslocam o artista e o receptor da Época Moderna, aquele na posição de fabricante da obra, a quem se atribui a sua origem, e o último na de seu destinatário fruitivo. Estamos diante do segundo e último resultado da “destruição” da Estética.

Analogamente à “destruição” da Ontologia, que não aniquila o que atinge, mas desconstrói o princípio ou o fundamento, liberando o originário neles encoberto, a “destruição” da Estética, realizada no duplo movimento hermenêutico de retrospecção e prospecção, perfaz-se retornando às fontes gregas, liberadas no presente. Para os gregos, segundo observam Vernant e Naquet, o artista ou o artesão, “não são verdadeiramente os autores da obra que produzem. Eles nada criam… A obra possui mais perfeição do que aquele que a produz, o homem é menor que a sua tarefa”,[15] Designativa tanto do trabalho do artesão quanta do artista, a palavra technites também significava o saber do ente e de sua eclosão, sob o aspecto ou aparência que o manifesta. Nesse sentido, em tudo diferente da técnica moderna, a techné converge para a physis, a eclosão do ente, que se associa a kalós, ao belo, como sua manifestação ou aparência. O artista não é a origem da aparência, fabricando a obra como technites, ele provoca essa manifestação. Num de seus costumeiros trocadilhos, Heideg-ger superpõe Schaffen a Schöpfen, criação e extração.[16] Criando, o artista extrai água de uma fonte da qual se abebera. Certamente que ele produz, mas com a produção emerge o que só na obra se configura e passa a existir, pela primeira vez, de maneira determinada e extraordinária.

A verdade que acontece na arte, agora já podemos dizê-lo, faz-se obra (ins Werk gesetzt) porque a verdade, como velamento e desvelamento, acontece poeticamente (gedichtet wird). Tanto não representacional quanto participativo, esse modo essencial da verdade, ao mesmo tempo essência da arte, ajusta-se, pelo seu caráter temporal, à nossa finitude. Dir-se-ia que nesse ponto Heidegger retifica o idealismo da Estética de Hegel, por ele acompanhada muito de perto.

Para Hegel, o desenvolvimento da arte é uma cena (Darstellung) histórica do espírito infinito, manifestando-se em cada povo, por meio da ideia encarnada na matéria sensível, e interiorizada gradualmente, da arquitetura à poesia, segundo diferentes formas de representação ou de concepção do mundo. A arte é verdadeira na medida de sua beleza — a aparição sensível do conteúdo, a ideia,[17] que transluz na matéria da obra, onde o espírito, intuitivamente captado, se torna visível. O espírito é o sujeito ativo e o objeto do saber teórico absoluto, superior à consciência individual, e que conhece o real todo, sintetizando-o na ordem dialética dos conceitos. Nessa perspectiva, o poético é um gênero desviante de representação intuitiva. Mas, para Heidegger, o poético, irrupção do ente que faz a verdade acontecer, abrindo o espaço de sua aparição a partir da terra que se desvela, antecede a ideia e a possibilidade. Como tal, em sua superabundância irradiante, o acontecer (Geschebenis) poético é doação (Schenken), e se intuímos a ideia numa vivência pontual, deve-se isso à projeção temporal do acontecer poético, que excede o presente, e funda a verdade (Stiften), quer dizer, instala-a como obra, e assim historicamente entrega-a aos seus destinatários — que a ela aderem e que lhe dão guarida — interligados aos criadores numa comunidade capaz de atualizá-la e de nela reconhecer-se. 0 poético é ainda, independentemente do conceito, a impactante abertura (Anfang), que põe em oposição mútua o mundo e a terra — esta sobressaindo em seu retraimento à custa daquele — num confronto e conflito formador da obra e que a obra mantém, entre o que se desvela (clareira, Lichtung) e o que, velado, encoberto permanece. “A arte é, pois, um devir e um acontecer da verdade”,[18] e nesse sentido, poema, à luz do verbo grego poiein, recuperado do alemão dichten.

Mas aqui chegados, reatamos com o pensamento da origein não inteiramente pensada — o ser esquecido — entrevista no início: o pensamento poético emergente nos pré-socráticos, bem como na arte e na poesia, e que toma pé na linguagem. Está claro que o terrnopoema, antes empregado, refere-se ao que é comum às duas; arte e poesia são interconiunican-tes; vale para a poesia a abertura do mundo e da terra. Esta última, a terra, ressalta o fundo poético variável das artes, a sua generalidade singular: a pedra como pedra na arquitetura e na escultura, as cores como cores na pintura, o som como som na música, a linguagem como dizer na poesia. Entretanto, a poiesis da linguagem mais especificamente da língua, considerada “poesia [Dichtung] no sentido essencial”[19] ou poesia originária, porquanto consumando a abertura por excelência, sem a qual não haveria mundo humano é o limiar e o limite de toda experiência, e consequentemente, também, da arte, cujo produzir-se requer a prévia situação do intercurso verbal. Daí o lugar privilegiado da poesia strict° sensu, a poesia-canto, entre as artes — privilégio que lhe vem da abertura insigne da linguagem como dizer (sagen) manifestante, revelatório, da palavra.

Paralelamente à rejeição da obra de arte em geral como objeto, Heidegger recusa a natureza exclusiva de veículo atribuída pela Linguística à palavra, enquanto som vocal ou imagem acústica, na qualidade de signo que interliga o significante ao significado. As palavras “são antes mananciais que o dizer perfura”.[20] E por isso, a criação do poeta — do poeta que canta (singenden Dichters) — é, tal como vimos anteriormente para o artista, uma extração da mesma fonte, a compreensão do ser que polariza o pensamento. O modo do dizer poético é original: está voltado para essa origem, “para o pensamento do ser”.[21] A poesia-canto desobjetifica a linguagem, retira-a do âmbito da visão prática, da ação e do intercurso cotidiano, a que serve de instrumento de comunicação, para o da abertura, temporal e histórica. Do mesmo modo que na arte a terra se torna terra, e não é propriamente usada, ao contrário do que sucede com o instrumento material, absorvido em seu próprio emprego, a poesia usa a palavra como palavra, sem gastá-la, liberando o seu poder de nomear, de fundar o ser, de desencobri-lo no poema. E o que distingue o poeta do pensador é que a nomeação naquele alcança o que excede à compreensão do ser em torno da qual o último gravita: o sagrado, indizível, estranho ao pensamento. “O pensador diz o ser. O poeta nomeia o sagrado.”[22] E ainda distinguindo-se dos pensadores, os poetas “fundam o que permanece”, conforme enuncia o verso de Hölderlin transcrito em “Hölderlin e a essência da poesia”, que complementa a doutrina de “A origem da obra de arte”.

Esse complemento insiste sobre o caráter temporal e histórico de tal fundação em Hölderlin, chamado de poeta da poesia, de sua essência, porque, à semelhança de outros poetas da modernidade — Stefan George, Rilke, Trakl, prediletos de Heidegger foi intérprete do sagrado no momento da “deserção dos deuses”, da Entgötterung, o estado “de indecisão relativamente a Deus e à divindade”[23] que constitui, ao lado do fastígio da Estética e do conhecimento científico, o terceiro e último traço definidor da Época Moderna. Prefiro traduzir Entgötterung por “desisteização”, para assinalar a correspondência desse estado, diferente do simples ateísmo, com a “morte de Deus”, o signo dramático do niilismo de nosso tempo a “desvalorização dos mais altos valores”, a falta de uma meta ,[24] anunciado por Nietzsche.

O niilismo, arremate da interpretação heideggeriana da Época Moderna que, já o vimos, enquadra a situação da arte e da poesia, é o último capítulo da História do ser: a fase do maior olvido do ser e do esgotamento da compreensão metafísica dominante. Essa interpretação deve muito a Nietzsche; e não apenas pelo niilismo, mas também pela noção nietzschiana de vontade de potência, lance final da elaboração metafísica. Para Heidegger, além da inefetividade da crença no Deus cristão, alvejado criticamente por Nietzsche, o niilismo engloba a perda de vigor da verdade metafísica, supra-sensível em nosso tempo. E como tal é a consequência lógica da vontade de potência, a forma extremada da subjetividade moderna, por força da qual o esquecimento do ser chega ao auge quando o homem, pela racionaliclade científica e pelo poderio da técnica, assegura o seu senhorio sobre a Natureza inteira. Mas, limitando-nos a assinalar tão-somente um aspecto do tortuoso capítulo da História do ser, e da não menos complexa interpretação heideggeriana dos textos nietzschianos que lhe serve de base, a vontade de potência, universalizada como princípio do real, implica uma surpreendente e derradeira metamorfose da verdade, enquanto “adequação da inteligência à coisa”. Assimilado à vontade de potência, o real converte-se em valor do infinito querer, e a “adequação” num fenômeno do querer e de seu valor. Não haveria verdade metafísica senão como vontade de verdade. Absoluta, a verdade metafísica, total adequação do sujeito cognoscente ao real, traduz a vontade de domínio que a filosofia transporta, malgrado seu, e de que está livre a alétbeia, a verdade acontecente na arte e na poesia.

Uma vez que a interpretação é o problema número um do pensamento, tal como o expusemos, religando a temporalidade, sentido da compreensão do ser à dominância histórica da Metafísica sobre a Filosofia em geral, extensiva à Estética moderna e a toda Filosofia da arte em particular, justifica-se, com base na retomada da interpretação grega originária, represada ou esquecida sob o primado do ente em suas variações epocais, a tese de que a arte é a verdade posta em obra. No entanto, essa marcha retrocessiva, para trás, na direção do mundo helênico, parece, a despeito do apoio que o mesmo pensar toma em seu marco referencial, a Época Moderna, incutir um viés anacrônico a tal entendimento, inatual diante do pletórico interesse teórico dos nossos dias em torno do poético. Argumenta-se que a descrição fenomenológica da obra de arte e da poesia stricto sensu, nos dois ensaios referidos, nada esclareceria acerca das obras contemporâneas,[25] passando mesmo ao largo da arte do nosso tempo e das revolucionárias mudanças que nela se operaram, já sedimentadas depois do estremecimento vanguardista dos anos 20, no período de que datam “A origem da obra de arte” e “Hölderlin e a essência da poesia”.

Quanto ao primeiro ponto, a objeção é falaciosa, exigindo desses dois ensaios o que eles só nos poderiam dar se fossem trabalhos de Crítica ou de Filosofia da arte. Não obstante, os esclarecimentos de ordem ontológica, respectivamente sobre a obra e a linguagem, que ambos prestam, elucidam, isto sim, o fundo entitativo dos pressupostos em que se apóiam a Crítica e a Filosofia da Arte. Desse ponto de vista, a hermenêutica heideggeriana, que desce ao nível dos fundamentos, não substitui as teorias correntes, seja a Semiótica, seja a doutrina das Formas simbólicas, nem fornece critérios para legitimar a validade estética de obras particulares. Mas, certamente, a despeito disso, os esclarecimentos de sua competência proporcionam-nos compreensão mais autêntica da arte e da poesia, e, sobretudo, uma visada crítica da insuficiência ou incompletude das explicações teóricas nesse campo. Tão intempestiva pelo recuo à Antiguidade quanto a genealogia nietzschiana da cultura ocidental, a hermenêutica heideggeriana é, no entanto, tão tempestiva relativamente à arte contemporânea quanta aquela o foi à de seu tempo, a partir da origem e decadência da tragédia grega que a polarizou. Acho mesmo que além da ressonância da revolução das artes plásticas no início do século, repercute no plano ontológico próprio da hermenêutica de Heidegger, a crise” dos fundamentos da criação artística em geral, que então se instaurou, inclusive no domínio da lírica moderna pós -simbolista a que pertencem Trakl, Stefan George elke. Não foi nesses poetas, sobretudo o vigor nomeativo da palavra, em seu poder de invocação e evocação, o que Heidegger recuperou em Hëlderlin, como essência da poesia? E não se dá também uma afinidade entre o espaço próprio da obra, por ela mesma formado, nas análises que acompanhamos, e a autonomia do espaço, conexa à forma pictórica e escultórica, um dos traços da revolução nas artes plásticas, após a ruptura, com o cubismo, da perspectiva espacial geométrica, como meio da representação do real?

A crise dos fundamentos a que me refiro é inversamente proporcional ao cultivo da arte, à cultura estética centralizada nos museus e vinculada à mídia e ao mercado. Quanto mais esse cultivo aumenta, mais tem aumentado a carência de discernimento do fazer artístico e da identidade da arte posta em questão. Seja obra ou não-obra, arte ou antiarte, tudo o que em nossos dias se produz artisticamente coma que traz o índice da interrogação dubitativa — o que é a arte? que se incorpora ao produzido. Eis, para repetirmos Arthur Danto, the main point, o ponto crítico atual.[26] E é esse ponto crítico, a crise de fundamentos da criação artística, que também o é de sua destinação, patente desde os movimentos de vanguarda, do futurismo ao abstracionismo, e depois, até os dias de hoje, em tantas manifestações diferentes, avulsas e exemplares concre-tistas, conceituais, experimentais, minimalistas, além das performáticas e instalatórias, parecendo todas e cada qual uma descoberta do mais originário, do mais autêntico da arte retomada ab ovo — o que relaciona a
problemática arte moderna à racionalidade científica e ao poderio da técnica, e também, consequentemente, ao niilismo, no quadro da interpretação da época anteriormente exposta.

Em princípio, essa relação confirma o caráter puramente histórico da arte, no sentido de que através dela mesma a história, como possível modo de existência humana, se concretiza nas três épocas antes assinaladas — a Antiga, a Medieval e a Moderna — de acordo com a prévia variante do ente posto em obra em cada uma delas. A história sanciona e assim legitima a problemática arte moderna, comensurada à dimensão do ente acessível pelo cálculo previsor da racionalidade científica e disponível à ação instrumental da técnica. Não poderíamos ter outra arte senão essa que se produz dubitativamente em torno de nós, à procura do novo ou de si mesma, imagem do “transitório, do fugitivo, do contingente”[27] espelhando, de crise em crise, o esquecimento do ser que atravessa o niilismo. Sob o aspecto da crise interna que alimenta a criação, a hermenêutica heideggeriana acompanha, novamente, muito de perto, a Estética de Hegel, que firmou, de forma singular, o caráter histórico da arte.

Para Hegel, a última fase do desenvolvimento artístico é o subjetivismo romântico, a etapa em que a atividade do espírito se realizando na reflexão do saber filosófico, âmbito de generalidade do pensamento e da ciência (Wissenschaft), supera o conhecimento intuitivo da arte pela ordem dialética dos conceitos. E assim o conteúdo desse conhecimento, a “aparição sensível da Ideia”, está condenado à irrelevância. O pensamento e a reflexão ultrapassaram as Belas-Artes.[28] Dado que, para Hegel, o conteúdo, a Ideia absoluta, é sempre o “divino, a vida de Deus”, esse ultrapassamento equivale a uma dessacralização das Belas-Artes. O predomínio da subjetividade, em consonância com a reflexão, corroeria a coe-sividade da criação artística, que deixaria de ser comunal para tornar-se exclusivamente individual e crítica. Nessas condições, o desenvolvimento histórico resulta num desvigoramento, numa perda de efetividade da arte, que passa a ser coisa do passado.

Os belos dias da arte grega e da idade de ouro da Idade Média avançada já findaram. As condições gerais do tempo presente não são mais favoráveis à arte. O próprio artista não somente está minado pelas reflexões que ouve formularem cada vez mais em torno de si, pelas opiniões e juízos correntes sobre a arte, mas toda nossa cultura espiritual se apresenta de tal maneira que lhe é impossível, mesmo por um esforço de vontade e de decisão, abstrair-se do mundo que se agita ao seu redor e das condições que o limitam… Sob todas essas relações, a arte é e permanece para nós, quanto à sua suprema destinação, uma coisa do passado.[29]

Já estetizada, quando Hegel escreveu essas palavras, a cultura aliou-se cada vez mais à ciência e à técnica, forças inabstraíveis que colocam o mundo sob a compulsão do progresso (Progressionszzvang), desencadeando o crescente domínio da razão instrumental em todos os setores da atividade humana. No início do século, ao mesmo tempo em que a reproduti-bilidade técnica da imagem, de que falou Walter Benjamin,[30] constitui o novo limiar da experiência criadora, quase todos os movimentos de vanguarda interiorizam procedimentos de fabricação industrial. Conforme observa Arnold Gehlen, “padrões técnicos” de pensamento orientam o fazer artístico, que adota a feição científica da experimentação ou do experimento.[31] No entanto, para a filosofia heideggeriana, esse avanço da razão instrumental, em vez de ser demissivo da “suprema destinação da arte”, representa uma ameaça à sua origem, ao acontecer poético da verdade. Na Estética de Hegel, o passadismo (Vergangenheitslehre) ou a “morte da arte”, é certeza; no epílogo de “A origem da obra de arte”, que recapitula e comenta o prognóstico de Hegel, é risco, perigo, objeto de interrogação dubitativa: “[…] é a arte ainda uma forma essencial e necessária em que acontece a verdade decisiva para o nosso Dasein histórico ou deixou a arte de ser tal?”.[32]

A verdade decisiva, fundadora, só poderia acontecer, como na Antiguidade e no Medievo, interligando os destinatários e os criadores das obras artísticas numa comunidade histórica. Porém, com o romantismo, as obras perderam esse poder coesivo; e atualmente, criadores e destinatários não mais se interligam. Torna-se claro que ao visar a forma essencial e necessária em que acontece a verdade, Heidegger refere-se sempre à “grande arte”, aquela, segundo Nietzsche escreveu, de cuja “significação unificante” (zentralisierende Bedeutung) uma civilização provem.[33] Mas que outra “grande arte” haveria para Heidegger senão a dos gregos? Entretanto, essa atitude preferencial, longe, muito longe está, de um intuito restaurativo dos “belos dias” de esplendor artístico da Antiguidade grega, de uma recuperação do passado “clássico”. Nem tampouco a concepção heideggeriana, que pela finitude se afasta do romantismo, poderia, como pretende Luc Ferry,[34] ser qualificada, em razão da verdade originária da obra condizendo com essa preferência, de um classicismo da diferença, base da fundação de uma arte futura. Ao niilismo, convergência da ratio calculadora e do poder da técnica, supra-sumo da Metafísica, chegada ao fim de seu fastígio, não se pode opor a terapia de uma arte fundadora a recuperar ou a construir, em substituição as formas artísticas que existem hoje. E se Heidegger pensa à contracorrente da época — de certo modo praticando o que Nietzsche chamou de niilismo ativo quando lembra a diferença que a Metafísica esqueceu, não pensa reativamente, atirando-se contra a arte, a ciência e a técnica.

No movimento retrocessivo as fontes, à primeira interpretação do ser esquecida, a physis dos pré-socráticos, que possibilitou as duas “destruições” conjugadas, a da Ontologia e a da Estética, Heidegger divisa o começo, a origem, a poiesis do pensamento que a Metafísica bloqueou. O regime da Metafísica, nos dirá o segundo tratado do filósofo depois de Ser e tempo, Contribuições à filosofia (1936), publicado postumamente em 1989, importou num desfalque histórico da arte (Kunstlosigkeit), privada do nexo com o sagrado que contraiu no começo.[35] É somente o aceno desse começo, não inteiramente pensado e que resta a pensar, o que podemos recuperar como penhor da necessidade de um pensamento poético oposto ao niilismo, porque livre da vontade de verdade. Mas seria livre dessa vontade sem que a ele renunciasse? A renúncia à vontade de verdade, igual à vontade de poder, marca o aspecto “edificante” da filosofia de Heidegger que, acolhedora da gratuidade do ser e da finitude humana, substitui a reflexão sobre o conhecimento teórico por uma dialogação com a poesia. Porém, sibilina, adverte-nos, agora, a voz de Zaratustra: os poetas mentem demasiadamente. E no entanto, também nos segreda, é mentindo que falam a verdade, como HOlderlin nestes versos de Mnemosyne: “[…] Lang ist/ die Zeit, es ereignet sich aber/ das Wahre” [Logo/ É o tempo; porém o vero/ acontece].[36]

 

[1] Richard Rorty, O espelho da natureza, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1988, pp. 227 ss.

[2] Michel Foucault, “Nietzsche, Freud, Marx”, em Cahiers de Royaumont, Paris, Les Editions de Minuit, 1967, pp. 188 e 190.

[3] Acompanhamos Sein und Zeit, Achte unveränderte Auflage. Tübingen, Max Niemeyer, 1957.

[4] Heidegger, “Der Ursprung des Kunstwerkes”, em Holzwege, Frankfurt am Main, Vittorio Klostermann, 1972, pp. 9 e 18.

[5] Idem, ibidem, p. 26.

[6] Idem, ibidem, p. 31.

[7] Idem, ibidem, p. 35.

[8] Idem, “Die Zeit des Weltbildes”, em Holzwege, p. 69.

[9] Idem, Nietzsche I, Pfullingen, Gunther Neske, 1961, p. 93.

[10] Schiller, Sobre a educação estética da humanidade, São Paulo, Herder, 1963, p. 19.

[11] Heidegger, “Der Ursprung des Kunstwerkes”, em Holzwege, p. 29.

[12] Gadamer, Wahrheit und Metbode, Tübingen, J. C. B. Mohr (Paul Siebeck), 1972, 90-1.

[13] Heidegger, “Der Ursprung des Kunstwerkes”, em Holzwege, p. 64.

[14] Idem, ibidem, p. 64.

[15] Jean-Pierre, Vernant e Pierre Vidal Naquet, Mythe et tragédie en Grèce ancienne, Paris, Editions de la Decouverte, 1989, pp. 73-4.

[16] Heidegger, “Des Usrprung des Kunstwerkes”, em Holzwege, p. 63.

[17] Hegel, Ásthetike I, Frankfurt am Main, Suhrkamp Verlag, 1970, p. 151.

[18] Heidegger, “Des Ursprung des Kunstwerkes” em Holzwege, p. 59.

[19] Idem, ibidem, p. 61.

[20] Idem, Was heisst Denken?, Tübingen, Max Niemeyer, 1971, p. 89.

[21] Idem, “Der Spruch des Anaximander”, em Holzwege, p. 303. Também “Hölderlin und das Wesen der Dichtung”, em Erläuterungen zu Hölderlins Dichtung, Frankfurt am Main, Vittorio Klostermann, 1971.

[22] Idem, Was ist Metaphysik?, Nachwort, Frankfurt am Main, Vittorio Klostermann, 1975, p. 51.

[23] Idem, “Die Zeit des Weltbildes”, em Holzwege, p. 70.

[24] Nietzsche, Werke III (von Karl Schlechta), München, Carl Hanser Verlag, 1956, p. 557.

[25] David Sobrevilla, Repensando la tradición occidental, Peru, Amaru Editores, 1986, p. 357.

[26] Arthur Danto, “The end of art”, em The philosophical disenfranchisement of art, Nova York, Columbia University Press, 1986, p. 110.

[27] Baudelaire, “Le peintre de la vie moderne”, em Oeuvres, Paris, Bibliotheque de la Pléiade, 1954, p. 892.

[28] Hegel, Ásthetik I, p. 24.

[29] Idem, ibidem, p. 24.

[30] Walter Benjamin “L’Oeuvre d’art au temps de ses techniques de reproduction”, em Oeuvres Choisies, Paris, Julliard, 1959.

[31] Arnold Gehlen, A Alma na era da técnica, Lisboa, Livros do Brasil, s/d., pp. 40 e 48.

[32] Heidegger, “Der Ursprung des Kunstwerkes”, em Holzwege, p. 67.

[33] Nietzsche, Das Plailosophen-Buch, Aubier-Flammarion, 1969, pp. 168-9.

[34] Luc Ferry, Homo aestheticus, Paris, 1990, p. 251.

[35] Heidegger, Beitrdge zur Philosophie, Frankfurt am Main, Vittorio Klostermann, 1989, pp. 503-6.

[36] Trad. de André Vallias (inédita).

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