1994

Seis nomes, um só Adorno

por Rodrigo A. P. Duarte

Resumo

Uma das teses principais da estética de Theodor W. Adorno é a de que a lei formal é o princípio básico de toda manifestação artística.  Seu pensamento estético pode ser entendido como ponto de entrecruzamento de diversas tendências e linhas de reflexão na filosofia da arte desde de o Idealismo Alemão, com Kant e Hegel, até a filosofia contemporânea, com Freud e Benjamin, passando pela transição representada por Marx e Nietzsche.

Dois tópicos da terceira crítica de Kant são explicitamente retomados por Adorno: as características do juízo de gosto e a supremacia do belo natural.

O belo natural é o elemento de ligação para a estética hegeliana. Adorno registra na estética hegeliana um avanço com relação à kantiana, principalmente nas objeções contra a estética de Kant: a ausência de um enfoque específico sobre a obra de arte e o caráter problemático da necessidade e da universalidade reivindicadas por Kant para o juízo de gosto.

No entanto, há um tópico no qual Adorno se coloca ao lado de Kant, contra Hegel, a saber, na tematização do belo natural. A determinação, por Hegel, da relação entre o estético e o extra-estético remete ao contato de Adorno com um filósofo que, apesar de não ter um pensamento explicitamente voltado para a estética, influenciou-a decisivamente: Karl Marx. Marx deu importante contribuição ao pensamento estético de Adorno quando formula a arte como “antítese social da sociedade” e permite também ao filósofo estabelecer um paralelo entre alguns termos empregados por Marx para descrever o desenvolvimento da produção material e o da criação artística.

Há um outro filósofo não menos importante para Adorno por ter toda a sua obra imbuída de estética: Friedrich Nietzsche.

Adorno subscreve a ideia nietzschiana de que a arte é a verdadeira antagonista do ideal ascético, enquanto forma de dominação. Em Adorno, porém, há um complicador: a arte, exatamente para se contrapor à dominação, é obrigada a se desartificar tornando-se, por um risco calculado, ascética.

A ligação do fenômeno estético às funções vitais mais elementares leva a investigação a outro autor cuja preocupação principal não é a arte ou a reflexão sobre ela, mas penetrar nos segredos mais recônditos da psique humana: Sigmund Freud. O ponto de interesse é a arte como um fenômeno derivado de complexos mecanismos psíquicos. O principal deles é a sublimação, uma espécie de desvio do alvo — libidinoso — da pulsão para outro menos comprometedor.

A atividade artística é certamente um alvo preferencial desses escapes da pulsão sexual, e o artista acaba por revelar no seu produto aquilo que ele esconde dos outros e de si mesmo.

Entretanto, há um problema central da psicanálise da arte: se o fenômeno estético trai a existência de distúrbios psíquicos no artista e a psicanálise visa a cura de manifestações desse tipo, a saúde mental coincidiria, no limite, com a inexistência da arte.

A ambiguidade da relação da obra de arte ao que lhe é exterior — um dos principais temas da estética adorniana — leva à consideração da influência de um filósofo que foi amigo pessoal de Adorno, tendo dialogado com ele pessoal e epistolarmente. Trata-se de Walter Benjamin, para quem o estético possui uma centralidade tão evidente quanto para Nietzsche ou para o próprio Adorno.

As colocações de Benjamin são de extrema importância para a estética adorniana no que se refere tanto à Origem do drama barroco alemão, quanto ao texto sobre a reprodutibilidade técnica da obra de arte.

Adorno defende a arte de vanguarda das acusações de hermetismo e introspecção, apontando para o caráter de falsificação que a explicitação literal dos conteúdos sociais na arte pode ter.

Essa posição assumida por Adorno a partir de uma remodelação do conceito benjaminiano de mônada, fornece-lhe o instrumental para criticar a ideia central da Obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica.  Para Adorno, o que é potencialmente revolucionário na arte não são os meios de que ela se vale, mas exatamente o seu procedimento monadológico, que atinge o cerne de sua lei formal.


O objetivo deste trabalho é menos introduzir o pensamento estético de Theodor W. Adorno, do que mostrar como ele pode ser entendido como ponto de entrecruzamento de diversas tendências e linhas de reflexão na filosofia da arte desde os primórdios do Idealismo Alemão, com Kant e Hegel, até a filosofia contemporânea, com Freud e Benjamin, passando pela transição representada por Marx e Nietzsche. Dessa forma, procura-se balizar a reflexão estética de cada um desses pensadores a partir de dois tópicos fundamentais: o lugar ocupado pelo estético e pela arte em cada uma dessas filosofias e a relação entre o estético e o extra-estético, isto é, aquilo que é mais radicalmente heterogêneo ao interior da obra. A eleição da estética adorniana como ponto de inflexão de todas essas filosofias não é de modo algum arbitrária, mas deve-se ao fato de ela guardar relação tanto com filosofemas do tipo dos de Kant e Hegel, para os quais a arte ocupa um lugar mais ou menos representativo num sistema filosófico, quanto com proposições de pensadores que tangem o estético, sem que ele seja o que mais lhes interessa — assim é com Marx e Freud —, reportando-se também a filósofos para os quais o estético possui uma espécie de função legitimadora do restante do seu pensamento, como ocorre com Nietzsche e Benjamin.

1

Tendo em vista que a mútua exclusão, no plano sistemático, de natureza e razão não coincide — pelo menos, não deveria coincidir — com suas múltiplas imbricações no plano da ação, Kant concebe a Crítica da faculdade de julgar não apenas como desfecho de sua filosofia, mas como uma ponte entre suas duas outras partes, cada uma delas centrada numa das faculdades cognitivas consideradas por Kant superiores — entendimento e razão. Enquanto o entendimento processa conceitos aplicáveis ao mundo dos fenômenos e a razão metaboliza os conteúdos da faculdade apetitiva (Begehrungsvermögen), a faculdade de julgar tem a ver — de um modo geral — com o sentimento de prazer ou desprazer. Levando em consideração um amplo conceito de finalidade da natureza (Zweckmässigkeit der Natur), Kant distingue na terceira crítica a representação lógíca da estética. Na primeira, podemos “considerar os fins da natureza enquanto apresentação do conceito de uma finalidade real (objetiva) […], julgar através do entendimento e da razão (de modo lógico, segundo conceitos)”.[1]

Na representação estética da finalidade da natureza, trata-se de abordar a beleza enquanto apresentação do conceito da finalidade formal (meramente subjetiva), na qual se destaca o sentimento de prazer ou desprazer, agora num sentido bastante específico. Esse tipo de representação institui todo um âmbito da terceira crítica, que coincide com a sua primeira parte, a crítica da faculdade estética de julgar que por sua vez se divide nas analíticas do belo e do sublime. Em ambos os casos, Kant, a exemplo de procedimentos utilizados em outros textos,[2] destaca quatro momentos que se remetem aos casos da tábua dos juízos da lógica aristotélica: qualidade, quantidade, relação e modalidade.

No que concerne à qualidade, trata-se de distinguir o juízo estético do juízo lógico: enquanto esse último atribui um predicado a um sujeito (lógico), determinando, portanto, características pertencentes a um objeto externo — transcendentalmente construído, é verdade —, o primeiro é essencialmente subjetivo: constitui-se a partir do sentimento de prazer ou desprazer ocorrido tão-somente no interior do sujeito (agora, concreto). Ocupa lugar de destaque, nesse momento, a caracterização do juízo de gosto (ou estético) como desprovido de qualquer interesse (satisfação ligada à representação da existência do objeto), o que o faz contrastar com os juízos acerca do bom e do agradável, os quais são — por definição — interessados.

Quanto à quantidade, Kant insiste na característica de o juízo de gosto ser universal, não obstante seu traço fundamental de subjetividade, a qual, por sua vez, é determinada pela ausência de conceito (entendido aqui como um tipo de representação que liga o objeto ao seu sujeito). Com isso, estabelece-se mais uma vez um contraste com o juízo lógico, cuja universalidade é essencialmente correlata à sua objetividade, sendo que no juízo estético coexistem os traços — aparentemente excludentes — de validade geral e subjetividade. Kant distingue universalidade (Allgem-einheit) de validade geral (Gemeingültigkeit), caracterizando essa última como um tipo de universalidade subjetiva.

No que tange à relação, Kant começa definindo fim como objeto de um conceito na medida em que esse é considerado causa daquele. Por conseguinte, finalidade é a causalidade de um conceito em consideração do seu objeto. Uma vez que “prazer” é definido como a consciência da causalidade de uma representação na intenção do sujeito de conservá-la em si, e que “finalístico pode ser um objeto, ou estado de ânimo, ou também uma ação, mesmo que sua possibilidade não pressuponha a representação de um fim” (KdU, B 33), Kant estabelece que a finalidade pode ser sem fim, na medida em que nós não pomos as causas dessa forma numa vontade (faculdade apetitiva agindo de acordo com a representação de um fim), mas, ao contrário, tornamos compreensível para nós somente a declaração de sua possibilidade, desviando-a da vontade. Com isso, estabelece-se a aparentemente contraditória fórmula da Crítica da faculdade de julgar, segundo a qual a “Beleza é forma da finalidade de um objeto, na medida em que ela é percebida nele sem a representação de um fim” (KdU, B 62).

Quanto à modalidade, Kant postula para o juízo estético um tipo de necessidade, que não é a teórico-objetiva do conhecimento a priori, tal como expresso na Crítica da razão pura, nem prática, como a da segunda crítica: é a necessidade da concordância de todos em um juízo, como exemplo de uma regra universal, que a rigor não pode ser dada. A condição desse tipo de necessidade é o que Kant chama de senso comum (Gemeinsinn), que difere, no entanto, do senso comum empírico, o qual dispensaria uma abordagem transcendental. Esse senso comum não poderia, portanto, estar fundado sobre a experiência, pois ele legitima juízos que contêm um dever ser (Sollen): dever-se-ia subscrevê-los, sem que isso seja, entretanto, compulsório.

Entretanto, os elementos comuns ao belo e ao sublime se limitam aos quatro momentos supra-aludidos, já que, no juízo sobre o belo, Kant fala no livre jogo entre a imaginação e o entendimento (KdU, A 29), enquanto no sublime aquela impera sobre esse (KdU, A 82). Uma aplicação “prática” dessa diferença ajuda a entender melhor em que ponto ambas as dimensões se separam inapelavelmente: na abordagem estética da natureza. Segundo Kant, “a beleza natural independente descobre para nós uma técnica da natureza, a qual torna-a imaginável com um sistema segundo leis, cujo princípio não encontramos em toda nossa faculdade de entendimento, isto é, o de uma finalidade respectiva ao uso da faculdade de juízo na consideração dos fenômenos, de modo a essa dever ser julgada não apenas como pertencendo à natureza no seu mecanismo desprovido de finalidade, mas também por analogia — à arte” (KdU, A 76).

No sublime da natureza falta, entretanto, qualquer referência a essa finalidade como pertencente à própria natureza, limitando-se ao uso possível de suas intuições. Isso o torna muito mais “subjetivo que o belo natural: Para o belo da natureza devemos procurar um fundamento fora de nós, para o sublime, porém, somente em nós e no modo de pensamento que na representação daquela introduz sublimidade” (KdU, A 77). Mas a superioridade do belo natural não se impõe apenas com relação ao sublime da natureza, havendo indícios de sua preferência por Kant até mesmo no que tange à bela arte. Um deles se expressa no seguinte trecho: “Essa vantagem da beleza natural sobre a beleza artística, mesmo que aquela, no que tange à forma, seja sobrepujada por essa apenas em despertar um interesse imediato, concorda com a notória e fundamentada maneira de pensar de todas as pessoas que cultivaram o seu sentimento ético” (KdU, A 165).

Com isso, estamos de posse dos dois tópicos da terceira crítica que são explicitamente retomados por Adorno sobretudo na sua Teoria estética:[3] as características do juízo de gosto e a supremacia do belo natural. Quanto ao primeiro item, cumpre observar que dos quatro momentos do juízo de gosto, dois se referem ao seu alcance: sua “universalidade” (2º) e sua “necessidade” (4º), e dois se referem à “ausência de interesse” no seu exercício (1º e 3º).

Adorno faz um julgamento ambivalente da contribuição kantiana à estética, problematizando radicalmente as propostas implícitas nos dois grupos de questões. A Teoria estética introduz, entretanto, um elogio explícito à empresa crítica aplicada à estética, classificando de “revolucionário” o seu intuito de — a exemplo do restante da obra de Kant — salvar a objetividade mediante a análise dos momentos subjetivos (ÁT, 22). Adorno reconhece, igualmente, a ainda válida contribuição kantiana no que tange à modalidade do juízo estético, “pois a experiência imanente das obras de arte, sempre que ela se inicia, é de fato, como Kant a descreve, necessária, transparente até mesmo nas suas mais sublimes ramificações” (ÄT, 189). No entanto, o caráter paradoxal dessa necessidade como também da universalidade — que permanece subjetiva num sentido radical (não apenas “transcendental”) não escapa à sua consideração: “Isso apresenta a categoria de mediação para o problema kantiano, de como a arte — para ele algo crassamente inconceituável — introduz consigo aquele momenta do necessário e universal, que, de acordo com a crítica da razão, é reservado apenas ao conhecimento discursivo” (ÄT, 175, cf. ;ÄT, 247).

Mais contundente —porque mais diretamente ligada ao cerne da sua proposta estética — é a abordagem, por Adorno, dos momentos que apontam para o “desinteresse” na experiência do juízo de gosto. Já quanto à qualidade desse juízo, na qual deve ficar expressa sua indiferença pela existência do objeto, a especificidade do agrado (Wohlgefallen) relativo ao belo fica potencialmente comprometida: “O Desinteresse afasta-se do efeito imediato que o agrado quer conservar, e isso prepara a interrupção na sua supremacia. Pois sem aquilo que, em Kant, se chama interesse, o agrado se torna em algo tão indeterminado, que não serve mais para qualquer determinação do belo” (ÄT, 22). Diante disso, Adorno conclui que a proposição do agrado desinteressado “é pobre diante do fenômeno estético” (ÄT, 22).

Também na ideia da finalidade sem fim (§ 11) encontra-se novamente a tese do desinteresse, pois na exclusão do fim, entendido como conceito que preside a instauração do seu objeto, a vontade faculdade apetitiva agindo de acordo com um fim — também fica necessariamente excluída, o que torna a finalidade meramente formal. Nesse caso, além de a crítica ao desinteresse como característica geral do juízo estético (isto é, quanto à sua qualidade) continuar valendo para o momento da relação, ela serve para introduzir um dos temas mais centrais da Teoria Estética, o relacionamento do âmbito estético com tudo o que lhe é exterior. Ouçamos Adorno:

A formulação paradoxal de Kant, segundo a qual deve-se chamar belo o que é finalístico sem fim, expressa o estado de coisas na linguagem da Filosofia subjetiva transcendental com aquela fidelidade que sempre renovadamente aproxima os teoremas kantianos da conexão metódica na qual eles surgem. As obras de arte eram finalísticas enquanto totalidade dinâmica, na qual todos os momentos singulares existem para o seu fim, o todo, do mesmo modo que o todo para o seu fim: o preenchimento ou dissolução negativa dos momentos. Sem fim, ao contrário, eram as obras de arte porque elas se retiraram da relação fim-meio da realidade empírica.  [ÄT, 210, cf. OL, 107]

Implícita nessa posição tomada frente à “finalidade sem fim” kantiana está uma ideia nuclear da estética de Adorno, segundo a qual existe na obra de arte uma dialética — interna — entre a totalidade e suas partes e uma outra entre a obra e o seu exterior. Os desdobramentos dessa posição serão abordados adiante.

O outro polo da apropriação adorniana da estética de Kant lhe é francamente favorável: trata-se do seu parti pris a favor do belo natural, já mencionado aqui. De fato, Kant foi o último filósofo a fazer uma avaliação positiva do belo não artístico, pois até mesmo Schelling, cuja concepção de natureza se entendia como uma alternativa ao mecanicismo vigente, expressa na “dedução transcendental da arte” no Esboço do sistema de idealismo transcendental um pronunciado desprezo pelo belo natural.[4] Adorno assinala que esse ponto de vista foi corolário de um processo iniciado também pelo próprio Kant, no sentido de exaltar o que é humano em detrimento da natureza: “O belo natural desapareceu da Estética mediante o crescente predomínio do conceito inaugurado por Kant, logo consequentemente transplantado para a Estética por Schiller e Hegel, de liberdade e de dignidade humana, de acordo com o qual não há nada no mundo digno de consideração que não se deva agradecer ao próprio sujeito autônomo” (ÄT, 98). Para Adorno, o fato de esse processo ter sido iniciado por Kant não invalida de modo algum sua enfática tomada de posição a favor do belo natural, e, numa época em que arte e natureza, apesar de toda a antítese segundo uma longa tradição existente entre ambas, se encontram na condição de vítimas de um mesmo aparato de destruição — de dominação da natureza “externa” e “interna” —, a retomada desse momento da estética kantiana lhe parece extremamente frutífera. Digno de nota, entretanto, é o modo pelo qual Adorno entende a solidariedade entre natureza e arte: não como uma unidade, mas conservando a oposição, sem fazer concessão a qualquer romantismo ou “naturalismo”: “A arte defende a natureza através de sua liquidação in effigie; tudo o que é naturalístico está próximo da natureza apenas de modo enganoso, porque ela — de modo análogo ao da indústria é relegada à condição de matéria-prima” (ÄT, 104). Nessa ideia está implícita também uma radical reformulação do antigo preceito da mimese, de acordo com a qual a arte não deve mais ser entendida como imitação da natureza, mas sim do belo natural (ÄT, 111). Considerando-se que Adorno entende o belo natural como “alegoria de um para além de’ ” (ÃT, 108), a imitação do mesmo pela arte mesmo que resguardada sua antítese à natureza — faz com
que ela projete necessariamente uma utopia reconciliatória, a qual — não menos necessariamente — permanece apenas ideal (essa ideia tornar-se-á mais clara adiante).

2

É exatamente o belo natural que nos fornece o elemento de ligação para a estética hegeliana próximo polo da tradição cuja abordagem é essencial para a formação do pensamento estético de Adorno. Como se mencionou acima, Kant foi o último filósofo para quem o belo natural era superior ao artístico; Hegel não apenas rejeita tal posição, mas, já nas primeiras linhas de suas Preleções sobre a estética, na explicação sobre a adoção do termo estética em contraposição ao seu intuito de fazer uma filosofia da arte, ele chega a excluir o belo natural do escopo das preocupações teóricas sobre a beleza:

Para esse objeto, o nome Estética decerto não é totalmente apropriado, pois “estética” designa mais exatamente a ciência do sentido, da sensação […]. Pretendemos nos utilizar do nome estética, porque ele, enquanto mero nome, nos é indiferente e, além disso, desde algum tempo se consagrou tanto na linguagem corrente, que ele pode ser conservado enquanto nome. A expressão propriamente dita para nossa ciência é “Filosofia da Arte”, e, mais exatamente, “Filosofia da Bela Arte” […J. Através dessa expressão excluímos o belo natural […]. Não devemos entender, nesse sentido, como arbitrária a limitação da estética à filosofia da arte […]. O mais elevado do espírito e sua beleza artística é diante da natureza não apenas algo relativo, mas o espírito é o verdadeiro que abarca tudo em si, de modo que todo belo só é verdadeiramente belo enquanto participante desse algo mais elevado e produzido através dele. Nesse sentido, o belo natural aparece apenas como um reflexo do belo pertencente ao espirito.[5]

Quando Hegel diz não ser arbitrária a exclusão do belo natural, ele está se referindo a certas articulações internas do seu sistema filosófico, segundo o qual a ideia (unidade do conceito com a sua realidade), depois de atingir seu absoluto enquanto abstrata, corporifica-se na materialidade da natureza, a qual, por sua vez, passa por um processo de evolução que vai da matéria inerte aos organismos vivos, passando por formações intermediárias como os sistemas estelares (dotados de movimentos complexos e “harmônicos”, sem serem propriamente vivos) (VÄ. I, 157-65). Dessa forma, por mais que possamos considerar belos os objetos da natureza, falta-lhes a marca do espírito, uma intencionalidade pela intervenção da qual a racionalidade impressa no seu “funcionamento” passe para a forma sensível, ligando interior e exterior do construto de modo que o fenômeno sensível seja racionalmente mediatizado: “Por causa dessa imediatidade apenas sensível, o belo natural vivo não é belo para si mesmo, nem a partir de si mesmo e produzido por causa do belo fenômeno. A beleza natural é somente belo para outro, isto é, para nós, para uma consciência que concebe a beleza (VÄ I, 167).

Isso aponta para a definição lapidar do “belo como aparecer sensível da ideia” (VÄ. I, 151), na qual fica patente a conexão interna entre o radicalmente espiritual (a ideia) e o imediatamente dado (aparência sensível). Tal definição, por sua vez, indica explícitamente o escopo da manifestação da beleza propriamente dita: a obra de arte, consolidada no conceito de ideal, isto é, a ideia numa forma determinada (VÄ: I, 145). Hegel define, então, as características que deve possuir a manifestação estética para desempenhar a contento a importante função de mediação por ela assumida, e, de fato, já nas primeiras páginas das Preleções ele vai se posicionar a favor não apenas da “bela arte” (cf, citação supra) mas da arte “autônoma”: “O que nós pretendemos considerar é a arte livre tanto nos seus objetivos quanto nos meios. Que a arte em geral possa servir também a outros fins, e, portanto, ser um mero apêndice, isso ela tem afinal em comum com o pehsamento” (VÄ I, 20).

Contrasta, entretanto, com essa declaração a favor de sua autonomia, a concepção da arte como essencial e não apenas casualmente — preenchedora de funções bem específicas, tais coma a supra aludida mediação entre a precária existência meramente objetiva e a representação simplesmente interior” (VÄ I, 215) e mais importante ainda — a tarefa de “dar consequência a altos carecimentos, algumas vezes os mais altos e absolutos, ligando-se as mais universais visões do mundo e a interesses religiosos de povos e épocas inteiros” (VÄ I, 50, cf. 73-5). Isso leva à caracterização de um conceito bastante específico de “autonomia da arte”, bem diferente daquele existente na atualidade: se, por um lado, Hegel desvaloriza a imitação “hiper-realista” do sensível pela arte (cf. VÄ I, 62-7), por outro, ele jamais abandona uma concepção figurativista do real, determinada por um claro limite imposto à imaginação na elaboração da obra: “Disso segue-se também que, segundo o aspecto do conteúdo, a bela arte não possa se entregar em selvagem incontinência à fantasia, pois esses conteúdos espirituais fixam nela, para seu conteúdo, determinadas constantes” (VÄ I, 28). Se, por um lado ele declara que não deve haver hiato entre forma e conteúdo (cf. VÄ I, 105), por outro ele chega a privilegiar explicitamente o conteúdo: “a arte mais alta é aquela que toma para si a tarefa de apresentação do mais alto conteúdo” (VÄ I, 225).

Esses contrastes podem ser entendidos como epifenômenos de uma incongruência maior: a colocação da arte no plano do espírito absoluto discrepando de sua inarredável característica de — ainda que prescindindo da imitação naturalística — ser definitoriamente presa ao sensível (dessa conexão depende sua característica de mediação imediata entre o espiritual e o corpóreo). Tal discrepância entre a exigência da mais alta abstração para um momento do espírito absoluto e o postulado da figuratividade sensível leva à conhecida tese hegeliana sobre o fim da arte, segundo a qual ela é superada por figuras mais espirituais como a religião revelada e a Filosofia. Ainda que a arte factualmente não desapareça — o que é certamente o caso —, ela perde sua dominância, deixando de ter o papel fundamental outrora desempenhado. Ouçamos Hegel:

Se conferimos, porém, à arte, por um lado, essa alta colocação, por outro, deve-se lembrar que a arte, nem segundo o conteúdo nem segundo a forma, é a forma mais alta e absoluta de trazer ao espírito seus verdadeiros interesses e consciência […]

O modo peculiar da produção artística e de suas obras não satisfaz mais nossas mais altas necessidades; estamos para além do ponto de poder adorar, endeusando, obras de arte e de orarmos diante delas […] O pensamento e a reflexão superaram a bela arte […]

Por isso nosso presente não é segundo o seu estado geral favorável à arte. Em todas essas relações a arte é e permanece, segundo o aspecto da mais alta determinação, algo passado para nós. [VÄ I, 23-5]

Como se pode depreender do trecho acima, o aspecto lógico-sistemático do fim da arte tem para Hegel consequências muito claras tanto no tocante à sua apreciação — e talvez principalmente — quanto no que concerne à sua produção já em inícios do século passado. Uma vez que, segundo as Preleções, a conexão do conteúdo da obra com a realidade factual — ainda que “purificada” nos termos do ideal — é absolutamente indispensável, a perda da dominância da arte deveria encontrar sua contra-partida no âmbito histórico o que, de fato, de acordo com Hegel, acontece. Segundo ele, oprosaísmo do mundo moderno dá um testemunho a mais sobre a dificuldade atual de se realizar obras de arte dignas do nome, o que é consequência da superação de uma situação histórica que exigia do indivíduo verdadeiros atos de heroísmo moral, uma vez que a conduta de um modo geral não se achava codificada como é hoje:

Se o conteúdo das circunstâncias é de outro tipo e traz a objetividade enquanto outras determinações em si do que aquelas que entraram na consciência do agente, então o homem atual não toma para si toda a extensão do que ele fez, afastando de si a parte de sua ação que através de ignorância ou má avaliação das circunstâncias se tornou ela própria diferente do que residia na vontade, e assume a responsabilidade somente pelo que ele sabia e realizou conscientemente em virtude desse saber. O caráter heróico não faz essa diferenciação, mas assume a totalidade do seu ato com toda a sua individualidade. [VÄ I, 246]

Daqui deixa-se encontrar também uma razão pela qual as formas artísticas ideais são remetidas à idade mítica, principalmente nos mais antigos dias do passado, como melhor solo para sua efetividade. [VÄ i, 248] [grifos meus]

O que Hegel — erroneamente — considerara uma possível ausência de conflito na consciência comum moderna, teria consequências imediatas para a Confecção das obras de arte, uma vez que aquela suposta pacificação passaria ao conteúdo dessas tornando-as — de modo semelhante à situação idílica (VÄ. I, 337) — aborrecidas ao ponto de não mais se poder apreciá-las. Portanto, as obras sobreviventes ao “fim da arteteriam necessariamente um traço de anacronismo por serem obrigadas a se reportar a uma situação histórica que decididamente já não é mais a nossa (VÄ I, 359).

Por outro lado, se o que Hegel chama de colisão é essencial na representação estética da realidade heróica, limites precisos devem ser atribuídos ao conflito, sob pena de desagregação definitiva do ideal corporifica-do na arte: “A colisão destrói essa harmonia e coloca o ideal, em si uno, em dissonância e oposição […] Até que limite, entretanto, deve a dissonância ser estimulada, não se devem fixar determinações gerais, porque cada arte particular segue, nesse sentido, o seu caráter peculiar […] Às artes figurativas, portanto, não é permitido tudo o que à poesia é admitido, já que nela algo se deixa aparecer momentaneamente para depois desaparecer” (VA 1, 268).

Esse problema da dissonância nos fornece uma boa oportunidade de retomar a estética adorniana, em sua conexão com a tradição filosófica alemã — especialmente aqui com Hegel. De um modo geral, Adorno registra na estética hegeliana um avanço com relação à kantiana, particularmente no que tange a duas das principais objeções que ele levantara contra essa última: a ausência de um enfoque específico sobre a obra de arte e o caráter problemático da necessidade e da universalidade reivindicadas por Kant para o juízo de gosto. No que concerne à primeira, Adorno lembra que “Hegel e sua época […] estabeleceram o conceito de uma arte que não —como era evidente para o filho do dix-huitième — simples‑mente ‘entretém a vaidade e a alegria social’ “(ÄT, 101), podendo-se depreender daí uma concepção enfática de obra, a qual falta em Kant. No tocante à segunda objeção, Adorno chama a atenção para o fato de que a noção central de espírito, na qual as obras se inscrevem, resolve o problema da universalidade e necessidade estéticas, explicitando sua característica de devir: “Universalidade e necessidade, que, segundo Kant, prescrevem ao juízo estético o seu cânone, mas nisso permanecem problemáticas, são construíveis para Hegel através do Espírito — a categoria que nele impera absoluta. O progresso dessa estética sobre todas as antecessoras é evidente […]” (ÄT, 139).

Adorno assinala igualmente o avanço da filosofia da arte hegeliana em relação à estética formal no que tange à determinação da referência imanente da obra de arte àquilo que não é ela mesma, ao seu outro, ao extra-estético em geral (cf. ÄT, 18, 512). Segundo ele, é correta a explicitação do aspecto conteudístico da arte e do seu processo dialético, segundo o qual, “na história da arte visual e da literatura novas camadas do mundo exterior foram continuamente tornadas visíveis, descobertas e assimiladas enquanto outras pereceram, perderam seu potencial artístico […]” (ÄT, 219). Entretanto, a estética hegeliana só pode conseguir isso circunscrevendo-se aos limites de uma estética de conteúdo, que termina por fazer concessões à mais crassa banalidade: mesmo tempo, a estética idealista de Hegel, que pensa forma enquanto conteúdo, regride a uma crueza pré-estética. Ela confunde o tratamento figurativo ou discursivo das matérias com aquela alteridade constitutiva da arte. Hegel se perde ao mesmo tempo contra sua própria concepção dialética de estética, com consequências para ele imprevisíveis; ele incentivou o traslado filistino da arte em ideologia de dominação”. (ÄT, 18).

Sob a pesada acusação inclusa no trecho acima deve-se entender uma crítica a outra incongruência legível nas Preleções, a saber, aquela entre a concepção da arte como parte do espírito absoluto pressupondo-se nela um altíssimo grau de “espiritualização” — e a exigência de que a arte seja essencialmente compreensível para um público leigo, expressa no trecho: “a obra de arte, porém, e a sua fruição imediata não é apenas para conhecedores e letrados, mas para o público, e os críticos não precisam ser tão pedantes, pois eles pertencem também ao mesmo público […]” (VÄ I, 357-8).

O aprofundamento da banalização do fenômeno estético introduzido pelo advento da indústria cultural — alvo de radical crítica por parte de Adorno — aponta para um outro tópico da filosofia hegeliana da arte, cuja retomada é essencial para constituição do pensamento estético do filósofo frankfurtiano: a questão do fim da arte.[6] Esse dá razão à definição hegeliana da arte como “consciência de necessidades”, no sentido de explicar por que, apesar de todas as circunstâncias desfavoráveis à sua existência, a arte continua a existir, assinalando, porém, o contraste entre aquela definição e a própria antevisão do fim da arte: “A estética hegeliana diferenciou-se, na verdade, daquela meramente formal, porque ela, apesar dos traços harmonísticos, da crença na aparição sensível da ideia, […] associou a arte à consciência de necessidades. Aquele que primeiramente previu um fim para a arte, mencionou o motivo mais acertado para sua persistência: a própria persistência das necessidades, as quais esperam por aquela expressão que as obras de arte, representando os desprovidos de fala, realiza” (ÄT, 512 ).

De fato, na antevisão hegeliana está implícito um tipo de otimismo sobre o desdobramento do espírito no seio da história, no bojo do qual as “necessidades” (Nöten) se extinguiriam, com a consequente extinção da “consciência” das mesmas — da arte. No momento atual, a “confiança no progresso real na consciência da liberdade […] foi amargamente decepcionada” (ÄT, 309) e a questão do fim da arte precisa ser recolocada, observando-se, em primeiro lugar, que a precariedade da existência humana presente torna ainda imprescindível a continuidade da arte. Em segundo lugar, que o fim da arte se coloca como possibilidade concreta no mundo atual, não em função de seu progresso espiritual, mas — ao contrário — da sua perversidade, da sua metamorfose num “mundo administrado”, no qual a racionalidade empobrecida em controle técnico sobre a natureza e a sociedade se coloca a serviço de tudo o que é mais irracional e desumano. Agentes dessa possibilidade são, segundo Adorno, 1) a indústria cultural, cujos produtos, voltados exclusivamente para o mercado, objetivam tomar o lugar outrora ocupado pela arte, porém sem qualquer resquício das suas ambiguidades características (inclusive aquela diante do mercado)[7] e 2) o obscurantismo político, cujo ápice foi atingido com os genocídios realizados pelos regimes totalitários no século XX.  Em conexão com esse último aspecto, Adorno lembra que a coerção exercida pelo totalitarismo está longe de ser um mero cerceamento extrínseco da liberdade de expressão, mas que a exacerbação do sofrimento acaba por provocar uma espécie de mutismo estético: “pela extinção da arte fala a crescente impossibilidade da apresentação do que é histórico. Que não haja qualquer drama satisfatório sobre o fascismo, não reside na falta de talento, mas o talento se atrofia na insolubilidade da mais urgente tarefa do poeta.[8]

Adorno observa que a indústria cultural, por outro lado, impõe a seu público o consumo de objetos cuja principal característica é a indistinção dprópria vida imediata, enquanto que o traço definitório da arte tradicional era a constituição de um âmbito específico, no qual se destacava sua “promesse du bonheur”,[9] cujo não-cumprimento era tão certo quanto estrutural. A isso adicione-se que a consciência reificada dos consumidores abusa dos construtos estéticos no sentido de que eles se tornem um espelho do vazio que se apoderou do seu psiquismo: “Como tábula rasa de projeções subjetivas, entretanto, a obra de arte é desqualificada. Os polos de sua desartificação são: tanto ela se torna em coisa entre coisas, quanto em veículo da psicologia do observador. O que as obras de arte alienadas não dizem mais, o observador substitui pelo eco standardizado de si próprio, o qual ele extrai delas. Esse mecanismo a indústria cultural põe em movimento e o explora” (ÄT, 33).[10]

A maneira pela qual a arte, enquanto “consciência de necessidades” continua a existir — em virtude da persistência das “necessidades” — procura exatamente neutralizar a coerção no sentido de se dissolver na “vida” tornando essa dissolução consciente e programática, o que se manifesta em todas as tendências da vanguarda estética do século XX, do cubismo ao happening, do dodecafonismo à música aleatória, da literatura “maldita” à poesia concreta. Nesse sentido, “a desartificação da arte se determina não apenas como grau da sua liquidação, mas também como tendência do seu desenvolvimento” ÄT, 123).

Resumindo, o trabalho crítico realizado por Adorno com relação a Hegel lhe é favorável sob muitos aspectos — principalmente aqueles nos quais suas objeções a Kant ficaram claramente explicitadas: a não-tematização da obra de arte propriamente dita e a problematicidade da universalidade e necessidade do juízo estético (cf. supra p. 458-9). No entanto, há um tópico no qual Adorno se coloca ao lado de Kant, contra Hegel, a saber, na tematização do belo natural, a qual permite não apenas recolocar o tema das relações homem-natureza num momento de aguda crise ecológica, mas também repensar o próprio estatuto da obra de arte como afiguração (mesmo que não literal) da realidade: “A arte não imita a natureza; tampouco o belo natural singular, mas o belo natural em si. Isso tange, por sobre a aporia do belo natural, a da estética como um todo. Seu objeto determina-se como indeterminável, negativo” (MY, 113).

3

A determinação, por Hegel, da relação entre o estético e o extra-estético — reconhecida por Adorno como uma de suas principais contribuições à reflexão filosófica sobre a arte — remete ao contato desse último com um filósofo que, apesar de não ter um pensamento explicitamente voltado para a estética, influenciou-a decisivamente: Karl Marx. Nesse, a ideia hegeliana da arte como “consciência de necessidades” tornou-se parte integrante de uma crítica da ideologia, segundo a qual “a produção das ideias, das representações, da consciência é antes de tudo imediatamente cone xa à atividade e ao intercâmbio materiais dos homens — linguagem da vida real” .[11] Que Marx não mencione explicitamente a arte nesse trecho, onde figuram a seguir “a produção espiritual” em geral e a “linguagem da política, das leis, da moral, da religião, da metafísica” em particular, remete a um outro texto seu, escrito onze anos depois, no qual ele se admira do fato de a arte dos gregos pressuposta a vinculação imediata da arte ao seu contexto histórico conservar um valor estético usufruído ainda hoje, pelos filhos de uma sociedade muito mais complexa e desenvolvida: […] a dificuldade não se encontra em compreender que a arte e o epos gregos estão atrelados a certas formas sociais de desenvolvimento. A dificuldade é que eles ainda nos proporcionam prazer estético e em certo sentido valem como norma e exemplos inatingíveis”.[12] Na colocação dessa questão, Marx dá um impulso muito maior à reflexão estética do que a explicação por ele encontrada, de que o interesse que a arte grega ainda desperta é função da irreversibilidade do desenvolvimento das formas históricas, o qual nunca mais trará uma sociedade como a grega antiga.

A abordagem dessa questão — da resistência da arte ao atrelamento imediato à infra-estrutura material da sociedade — inspira Adorno na elaboração de uma das fórmulas mais lapidares da Teoria estética: a definição da arte como “antítese social da sociedade, impossível de ser imediatamente dela deduzida” (ÄT, 19). Nessa colocação, ao mesmo tempo em que a vinculação da manifestação estética ao contexto histórico aparece no adjetivo social acrescentado à “antítese”, fica explicitada nesse último termo a problematicidade da relação, infelizmente ignorada por muitos autores de origem marxista. À concepção da arte como “reflexo” da realidade social por eles defendida, Adorno contrapõe sua ideia de que “os antagonismos irresolvidos da realidade retornam à obra de arte coma problemas imanentes de sua forma” (ÄT, 16), provocando um giro radical no modo mais simples e mais cômodo de pensar as relações entre o estético e o extra-estético: o puro e simples atrelamento daquele a esse. Esse giro permite entender de que maneira o produto estético das vanguardas programaticamente inovadoras no tocante às formas em todas as artes é o que melhor “reflete” a realidade social, sem que haja nele a menor sombra de temática “engajada” ou mesmo de afiguração explícita daquela

Quando se disse, aqui, que Marx deu importante contribuição ao pensamento estético de Adorno, sem que tenha escrito uma só obra inteiramente dedicada ao tema, tinha-se em mente que a formulação da arte como “antítese social da sociedade” permite também ao filósofo estabelecer um paralelo entre alguns termos empregados por Marx para descrever o desenvolvimento da produção material e o da criação artística. O mais usado deles é o das “forças produtivas estéticas” (ou artísticas). Enquanto conceito econômico, “forças produtivas” aparece pela primeira vez na Ideologia alemã, significando o conjunto dos meios técnicos dos quais uma sociedade dispõe para satisfazer os seus carecimentos materiais. Uma vez que novas necessidades — mais mediatas — podem ser criadas pela complexificação da produção oriunda do processo mesmo de satisfação daquelas mais elementares, as forças produtivas entram num contínuo desenvolvimento em interação dialética com as relações sociais que lhes servem de suporte, podendo até mesmo rompê-las e instaurar uma situação revolucionária (DI, 207 ss.). Adorno transpõe esse conceito para a criação artística, observando que as diferentes épocas possuem um standard próprio de domínio sobre o material estético, e que existe um tipo de desenvolvimento interno desses meios mediatamente estimulado por demandas do plano histórico, social: “A pontada que a arte dirige à sociedade é, por sua parte, algo social: reação contra a pressão surda do body social; como o progresso intra-estético, um progresso das forças produtivas, principalmente da técnica, irmanado ao progresso das forças produtivas extra-estéticas. Por vezes, as forças produtivas estéticas desencadeadas representam aquele desencadeamento real, que é obstaculizado pelas relações de produção” (ÄT, 56).

Que a ideia da arte como antítese social da sociedade tenha que atuar como um pressuposto no sentido de evitar que o conceito de força produtiva estética (e outros análogos) seja entendido como um atrelamento imediato da arte à sociedade, está explícito no trecho acima pela referência à “pontada que a arte dirige à sociedade, tema que será retomado adiante.

4

Enquanto Marx não escreveu nenhuma obra específica de estética ou filosofia da arte, tendo tratado apenas en passant da arte como fenômeno superestrutural e influenciado Adorno também onde ele não falou especificamente de arte, há um outro filósofo não menos importante para o frankfurtiano — que também não escreveu livros de estética, mas por um motivo oposto: porque toda a sua obra está imbuída de estética. O filósofo em questão é Friedrich Nietzsche, cuja centralidade do estético procurarei caracterizar a seguir.

Já na época do Nascimento da tragédia, Nietzsche parte da caracterização dos momentos apolíneo e dionisíaco — emanação direta de forças vitais da natureza — e da sua inserção no drama grego clássico para construir a ideia de uma sociedade inteiramente perpassada pelo estético — veiculado antes de mais nada pelo mito o qual confere à vida uma espécie de justificativa, “pois somente como fenômeno estético a existência e o mundo são eternamente legitimados. [13]Ou, colocado de outra forma, só a arte “pode transmutar aqueles pensamentos nauseantes sobre o horror e o absurdo da existência em representações, com as quais torna-se possível viver: elas são o sublime como domesticação do horror e o cômico como a descarga artística da náusea do absurdo” (WW, I, 49).

Como se sabe, a difusão do estético por toda a sociedade no período grego clássico era, para Nietzsche, função de um mútuo recobrimento entre os momentos apolíneo e dionisíaco, o qual deixa de existir no momento de decadência da tragédia e de ascensão da racionalid.ade científica e filosófica, cuja figura emblemática é ninguém menos que Sócrates: “Aqui, o pensamento filosófico ultrapassa a arte e obriga-a a entrar num apertado colar-se ao tronco da dialética. No esquematismo lógico a tendência apolínea desabrochou Sócrates, o herói dialético no drama platônico,
lembra-nos da natureza aparentada do herói euripídico, que através de argumento e contra-argumento deve defender sua ação e, com isso, cai frequentemente no perigo de perder nossa compaixão trágica” (WW, 1, 80).

Nietzsche vê na sociedade europeia moderna o corolário desse processo de “desestetização” da existência iniciado já no período de decadência da tragédia grega, no qual o fluxo da vida fica sem um tipo de representação que faça jus ao seu dinamismo, já que a coerência lógica — principal instrumento do homem científico —  não dá conta do mesmo: “Além disso, ele sente como uma cultura erigida sobre o princípio da ciência deve submergir quando ela começa a se tornar ilógica, isto é, a fugir de suas consequências. Nossa cultura revela essa precariedade universal […]” (WW, I, 102). A partir dessa constatação, Nietzsche detecta na arte sua contemporânea os sinais de enfraquecimento da cultura como um todo, perdendo essa última qualquer vinculação ao fenômeno estético, o qual, por sua vez, se degrada num produto destinado à apreciação filistina: “Não há qualquer outro período artístico, no qual a chamada cultura (Bildung) e a arte propriamente dita fossem tão estranhas e tão aversas uma à outra, como vemos com nossos próprios olhos no presente” (WW, I, 112). Explicitando melhor o que ele quer dizer com isso, Nietzsche parece antecipar em várias décadas o que viria a ser a crítica da cultura realizada pela chamada Escola de Frankfurt, da qual participou Adorno: “Quando o crítico no teatro e concerto, o jornalista na escola, a imprensa na sociedade, chegaram a dominar, a arte se degenerou num objeto de entretenimento da mais baixa espécie, e a crítica estética foi usada coma cimento de uma sociabilidade ociosa, dispersa, egoísta e, além disso, pobre e sem originalidade […] (WW, I, 124).

Por mais que Nietzsche, na sua “Tentativa de uma autocrítica” — escrita quinze anos depois do Nascimento da tragédia — tenha renegado a mistura do “grandioso problema grego” com “as coisas mais modernas” (WW, I, 16) e escarnecido da ideia da arte como legitimação metafísica do mundo, a centralidade do estético permaneceu intocada no seu pensamento posterior, marcadamente mais crítico que a obra de 1871.

Num dos seus mais conhecidos textos de crítica do conhecimento, Sobre verdade e mentira no sentido extramoral, Nietzsche combate o antropocentrismo gnosiológico da espécie humana, lembrando que a universalidade e necessidade das proposições científicas são uma invenção do próprio homem. A verdadeira “necessidade” da ciência é aquela oriunda do instinto de autoconservação, a qual parece ser esquecida — recalcada — tão logo se chega ao estabelecimento de proposições gerais sabre as coisas do mundo exterior. Essas coisas, aliás, são também problematizadas por Nietzsche do seguinte modo: certo estímulo nervoso na espécie humana, depois de milênios de adestramento, passa a indicar imagetica-mente certo objeto externo, cuja existência “em si” é apenas um “X” (cf. WW, III, 317). Na formação de uma palavra, ocorre a adição outra “metáfora” a essa primeira: “Um estímulo nervoso, primeiro transposto numa imagem! Primeira metáfora. A imagem é posteriormente transformada num som! Segunda metáfora” (WW, III, 313). Se a palavra não diz respeito apenas um objeto particular, mas pretende designar toda uma “espécie”, ela se torna um “conceito”, cuja principal característica é a abstração dos traços individuais das coisas por ele definidas. “Todo conceito surge através da igualação do não-igual. Tão certo como uma folha nunca é totalmente igual a outra, o conceito folha é formado através do abandono arbitrário dessas diferenças individuais e desperta, então, a ideia de que existiria algo na natureza, fora das folhas, que seria ‘a folha’, um tipo de forma originária, segundo a qual todas as folhas seriam tecidas, desenhadas, medidas, tingidas, frisadas, pintadas, mas por mãos desajeitadas, de modo que nenhum exemplar seria correto e confiável como imagem fiel da forma originária” (WW, III, 313).

É a partir dessa desvalorização do conceito como meio de contato com a realidade, a qual se remete à problematicidade da ligação entre o mundo exterior e o intelecto, que Nietzsche erige a dimensão estética num tipo de “fundamento” dessa ligação, “pois entre duas esferas absolutamente diferentes como sujeito e objeto, não há qualquer causalidade, qualquer correção, qualquer expressão, porém no máximo um procedimento estético, quero dizer, uma transposição alusiva, uma tradução balbuciante numa linguagem totalmente estranha, para a qual precisa-se de qualquer modo de uma esfera e de uma força intermediárias livremente poetantes e inventivas” (WW, III, 317).

Para explicitar e colocar em termos mais concretos essa relação estética com o mundo, Nietzsche lança mão — mais uma vez — dos gregos, “esse povo miticamente estimulado” (WW, III, 320), que soube transformar a vida numa espécie de sonho diurno, sem que tenha sido nisso ingênuo ou inconsciente.

Como exemplo da forma acabada da centralidade do estético em Nietzsche, podemos nos reportar à Genealogia da moral, obra tardia em que a moralidade ocidental — principalmente cristã — tem seus pressupostos dissecados e é radicalmente desmascarada enquanto ideologia de dominação. O primeiro momento dessa crítica é a contraposição do par bom/ruim ao — normalmente aceito — bom/mau. Segundo Nietzsche, originariamente, os homens superiores, nobres, se auto-intitularam “bons” para designar sua força, destreza física, habilidade militar e até mesmo sua honradez e generosidade, reservando o adjetivo ruim aos demais, não possuidores dessas qualidades (WW, II, 272 ss.). O surgimento do par bom/mau que acabou por predominar esmagadoramente sobre seu antecessor seria já uma corrupção, uma degeneração do mesmo — uma inversão, segundo a qual o que era o bom — forte, rico, bem-nascido, inteligente — passa a ser visto como mau, e o que era o ruim — fraco, pobre, vulgar, imbecil — passa a ser considerado bom. Isso se deu, segundo Nietzsche, por um “levante dos escravos na moral” (WW, II, 780, cf. Para além do bem e do mal, §195 WW, II, 653) em que os nobres guerreiros foram sub-repticiamente suplantados pelos sacerdotes ascéticos, os quais se valeram do “rebanho” para a consolidação dos seus objetivos de dominação. Chama a atenção o fato de que, apesar de Nietzsche se valer de preconceitos racistas e anti-semitas (cf. WW, 11,776-9) para denunciar isso que ele considera uma perversa transvaloração, ele o faz tendo em vista — e ansiando por — uma concepção de moral autônoma, cujos valores são dados por seus próprios sujeitos e não reativamente, como na moral convencional (cristã), que ele chama de “moral do ressentido” daquele que, não podendo achar imediatamente em si as qualidades do nobre, procura achar nele todos os defeitos para poder vir a se considerar alguém “bom”. Digna de nota é também a minuciosa descrição, por Nietzsche, dos expedientes utilizados pelo sacerdote ascético no sentido de mobilizar o ressentimento dos fracos para dominar sobre os “fortes” (isto é, os bons), cuja menção aqui nos afastaria do objetivo principal — a caracterização do estético na sua obra.

Ela começa com a sugestão de que os nobres guerreiros, “animais de rapina, representantes da moral dos senhores, são também portadores de um tipo de ética que não tem nada a ver com os ideais ascéticos, e que, portanto, tem em si algo de estético: “Poder não levar longamente a sério seus inimigos, seus acidentes, até mesmo suas atrocidades — isso é o signo de naturezas inteiramente fortes, nas quais se encontra um excesso de força plástica, refigurativa, curativa, e que faz esquecer” (WW, ii, 784). Essa contraposição entre ascético e estético leva ao cerne da visão nietzschiana sobre o papel da arte na vida, o que, por sua vez, mostrará uma conexão profunda com a estética de Adorno. Nietzsche se pergunta se haveria alguma dimensão cuja vontade de verdade fosse realmente sincera, sendo, portanto, antagônica ao ideal ascético com seu caráter de mistificação interessada. A menor insinuação da ciência como essa opositora do ideal ascético é enfaticamente rejeitada por ele: “Não! Não me venham com a ciência, se procuro o antagonista natural do ideal ascético […] Sua relação ao ideal ascético ainda não é em si inteiramente antagonística; ela se apresenta no principal até mesmo com força impulsionadora no seu aperfeiçoamento […] A arte, na qual exatamente a mentira se santifica, a vontade de ilusão tem a consciência leve ao seu lado, está contraposta ao ideal ascético de modo muito mais fundamental que a ciência” (WW, II, 891-2).

Outro trecho da Genealogia reforça essa oposição, revelando uma conexão até mais literal com a estética adorniana. Trata-se daquele em que Nietzsche problematiza a universalidade e a “impessoalidade” da concepção kantiana do belo e — principalmente —          o desinteresse no juízo de
gosto: ” ‘Belo é’, disse Kant, ‘o que agrada sem interesse’. Sem interesse! Que se compare com essa definição uma outra, que um real ‘espectador’ e artista fez — Stendhal, que uma vez chama o belo une promesse de bonheur. Aqui, em todo caso, é recusado e riscado aquilo somente que Kant no estado estético destaca: le désinteressement” (WW, II, 845-6).

Essa definição do belo dada por Stendhal passa a ser uma espécie de lema para todas as concepções filosóficas para as quais a estética é uma dimensão central e não apenas o ornamento de uma filosofia depauperada. Não apenas Adorno (cf. supra) adota esse lema, mas também Benjamin e Marcuse, dentre outros.

A conexão de Adorno com o pensamento estético de Nietzsche, a qual certamente não se limita à crítica da banalização filistina da cultura, é bem menos literal do que com o dos outros autores aqui tratados — talvez,
por isso, mais profunda e visceral. A “promessa de felicidade”, por exemplo, ganha uma explicitação que, sem trair o espírito da proposta nietzschiana, confere-lhe uma nova amplitude: “A arte não é apenas lugar-tenente de uma práxis melhor do que aquela até hoje dominante, mas também crítica da práxis enquanto dominação da brutal autoconservação no seio do existente e em favor dele. Ela denuncia a mentira da produção em benefício de si mesma, opta por um estado da práxis para além da prisão do trabalho. Promesse du bonbeur significa mais do que o fato de a práxis até aqui mascarar a felicidade: felicidade estaria acima da práxis (ÃT, 26).

Interessantemente, Adorno sugere aqui que a promesse não está principialmente contraposta ao désinteressement, mas que esse pode estar no final de um processo integrado por aquela. Não escapou a Adorno que o belo enquanto promesse está ligado à arte como aquela “mentira que se santifica” mencionada por Nietzsche: “Arte é a promessa de felicidade [Versprecben des Glücks] que é quebrada” (ÄT, 205). Estruturalmente quebrada, poderíamos completar, pois, no seu caráter necessário de representação conscientemente ilusória, ela apenas aponta na direção “de um estado da práxis para além da prisão do trabalho”. Mas, para Adorno, isso não é de modo algum desprezível: na medida em que, no “mundo administrado”, a dominação se imiscui em todos os âmbitos da vida, não poupando também o conhecimento científico e filosófico, a arte se mantém parcialmente retirada desse processo, por sua dialética de atração e repulsão simultâneas com relação ao seu exterior. Isso leva Adorno a subscrever a ideia nietzschiana de que a arte — e não a ciência — é a verdadeira antagonista do ideal ascético, enquanto forma de dominação. Em Adorno, porém, há um complicador: a arte, exatamente para se contrapor à dominação, é obrigada a se desartificar (cf. supra), tornando-se, por um risco calculado, ascética: “O preto e cinza da nova arte, sua ascese contra a cor é negativamente sua apoteose” (ÄT, 204).

5

A ligação do fenômeno estético às funções vitais mais elementares leva a investigação a outro autor — também importante para a formação da estética adorniana —, cuja preocupação principal não é a arte ou a reflexão sobre ela, mas penetrar nos segredos mais recônditos da psique humana: Sigmund Freud. A ele interessa a arte como um fenômeno derivado de complexos mecanismos psíquicos, cujo estudo se apresenta como uma oportunidade de aprofundamento nos conhecimentos sobre os mesmos. O principal deles é a sublimação, entendida como uma espécie de desvio do alvo — libidinoso — da pulsão para outro menos comprometedor: “A observação da vida cotidiana dos homens nos mostra que é possível à maioria dirigir parcelas consideráveis de suas forças pulsionais sexuais para sua atividade profissional. A pulsão sexual se presta particularmente bem a fornecer essa contribuição, porque ela é dotada da capacidade de sublimação, isto é, está pronta a cambiar seu alvo mais próximo por outros, eventualmente mais valorizados e não sexuais.[14]

A atividade artística é certamente um alvo preferencial desses escapes da pulsão sexual, e o artista acaba por revelar no seu produto aquilo que ele esconde dos outros e de si mesmo: Ao artista é dado por uma generosa natureza trazer à expressão suas emoções mais secretas, ocultas até a ele mesmo, através das criações, as quais atingem poderosamente os outros — estranhos ao artista — sem que eles mesmos saibam dizer de onde vem essa comoção” (SKL, 132).

O lado positivo da avaliação feita por Adorno sobre as ideias freudianas acerca da arte se revela na conexão explícita da criação artística com a vida pulsional dos seus sujeitos, o que apresenta um avanço com relação à estética do idealismo, segundo a qual a arte se constitui num domínio absolutamente fechado, sem comunicação com o exterior. Segundo Adorno: “A teoria psicanalítica da arte tem a vantagem sobre a idealista de lançar luz naquilo que, no próprio interior da arte, não é artístico. Ela ajuda a resgatar a arte do âmbito do espírito absoluto. Ao idealismo vulgar, que, com rancor contra o conhecimento do seu entrelaçamento com a pulsão, gostaria de pôr a arte de quarentena numa esfera pretensamente mais elevada, ela se contrapõe no espírito do esclarecimento” (ÄT, 20).

Entretanto, Adorno critica na teoria psicanalítica da arte exatamente o fato — não estranho aos seus objetivos — de sua ênfase recair no aspecto psicológico do artista: “Ela é psicologicamente mais rentável do que esteticamente. Para ela as obras de arte valem essencialmente como projeções do inconsciente daqueles que as produzem, e ela esquece as categorias formais sobre a hermenêutica da matéria, ao mesmo tempo transpõe o filistinismo de médicos sofisticados para o mais inepto objeto, para Leonardo ou Baudelaire” (ÄT, 19).

Seu descompromisso, portanto, com o que de mais especificamente estético é total, igualando as obras de arte a sonhos diurnos (AT, 20, cf. SKL, 175 ss.) e ignorando a dimensão mais objetiva da obra de arte — sua qualidade enquanto tal. O próprio Freud reconhece os limites da abordagem psicanalítica da obra de arte quando diz: “Mesmo com o talento artístico e a capacidade de desempenho dependendo intimamente da sublimação, devemos confessar que a essência mesma do desempenho artístico não nos é psicanaliticamente acessível” (SKL, 157, cf. 154, 158). De fato, chama a atenção de Adorno a indiferença do psicanalista no tocante à qualidade das obras,[15] exemplicando com a história da pintora que caçoou das péssimas gravuras de Viena que enfeitavam o consultório do psicanalista e teve como resposta um voto de desconfiança do mesmo sobre as razões que a levavam a agredi-lo.

Em vista disso, configura-se como o problema central da psicanálise da arte, para Adorno, o fato de ela não dar conta do polo negativo da relação entre a obra e a vida pulsional, que se expressa na tensão daquela para com o existente: se o fenômeno estético trai a existência de distúrbios psíquicos no artista e a psicanálise visa a cura de manifestações desse tipo, então para ela, a saúde mental coincidiria, no limite, com a inexistência da arte. Pelo menos daquela negatividade que, segundo Adorno, lhe é essencial (ÁT, 21). A conclusão a que ele chega é que, a despeito do progresso com relação à estética idealista — por ele mesmo apontado — a teoria psicanalítica da arte não supera o subjetivismo daquela: “Correlativamente à fraqueza da kantiana, a teoria freudiana da arte é muito mais idealista do que ela pensa. Transpondo as obras de arte puramente para a imanência psíquica, elas são desprovidas da antitética ao não-eu. Esse permanece ileso às pontadas das obras de arte; aquelas se esgotam no desempenho psíquico do domínio da renúncia pulsional, em última análise na adaptação” (ÄT, 25).

6

A ambiguidade da relação da obra de arte ao que lhe é exterior — um dos principais temas da estética adorniana — leva à consideração da influência de um filósofo que, à diferença de todos os outros aqui enfocados, foi amigo pessoal de Adorno, tendo dialogado com ele pessoal e epistolarmente. Trata-se de Walter Benjamin, para quem o estético possui uma centralidade — pelo menos — tão evidente quanto para Nietzsche ou para o próprio Adorno. Na impossibilidade de apresentar o pensamento estético de Benjamin no pouco espaço disponível, adotarei a estratégia de apontar para o que é essencial no tocante ao nosso tema em dois textos: o Prefácio gnosiocrítico da Origem do drama barroco alemão[16] e A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica.[17]

No Prefácio gnosiocrítico, a centralidade do estético encontra-se delineada já na opção explícita pelo tratado como tipo de escrita filosófica na qual o conteúdo de modo algum se desvincula da forma de apresentação, o que o torna mais apto a perguntar pela verdade e não apenas produzir conhecimento. Mas isso só tem sentido a partir da reabilitação do valor cognitivo das ideias, num sentido quase platônico: “Se a apresentação quer se afirmar como método do tratado filosófico propriamente dito, então ela deve ser apresentação das ideias. A verdade se presentifica na roda das ideias apresentadas, foge a qualquer projeção — mesmo que bem estruturada — no âmbito do conhecimento” (UdT , 11). Pois o conhecimento tem a ver fundamentalmente com a posse de certas representações na consciência, em última análise, com propriedade — algo totalmente desimportante para a apresentação das ideias no sentido da atualização da verdade. Para Benjamin, essa representa uma unidade imediata no próprio ser, a qual se dá à contemplação, enquanto o conhecimento seria uma unidade mediatizada por conceitos, advindos da espontaneidade do entendimento (UdT, 12).

A presença do estético, até aqui simplesmente insinuada, concretiza-se na referência ao Banquete de Platão, no qual a verdade, enquanto reino das ideias, é desenvolvida como o conteúdo essencial da beleza. E essa relação entre ambas não deve ser entendida apenas como objetivo superior de qualquer ensaio de filosofia da arte, mas é indispensável para a. determinação do próprio conceito de verdade. Falando-se mais especificamente, “aquele momento de apresentação na verdade é o refúgio da beleza em geral”, o que leva à questão: A verdade pode ser adequada ao belo? Essa questão é a mais interna no Banquete. Platão a responde destinando à verdade a tarefa de acolher o ser no belo. Nesse sentido, portanto, ele desenvolve a verdade como o conteúdo do belo” (UdT, 13).

Essa verdade-beleza que se apresenta como una e singular no mundo das ideias, deve ser traduzida, no âmbito da existência humana, em conceitos que se referem às disciplinas particulares, havendo uma espécie de dispersão, de pulverização das ideias, a qual — tanto quanto possível deveria ser evitada pela forma de apresentação. Mas isso não pode se efetivar, porque “as grandes estruturas, que determinam não apenas os sistemas, mas a terminologia filosófica — as mais universais: Lógica, Ética e Estética têm, pois, seu significado não apenas como nomes de disciplinas específicas, mas como lembretes de uma estrutura descontínua do mundo das ideias” (UdT, 15). Os fenômenos existentes no mundo empírico são “salvos” de sua falsidade primordial por sua conexão ao mundo das ideias, por intervenção dos conceitos.

Mas os fenômenos não estão de modo algum incorporados nas ideias: elas são apenas “sua organização virtual objetiva, sua interpretação objetiva” (UdT, 16). Dessa forma, as ideias não passam de representações dos fenômenos, às quais seus elementos, dissolvidos pelos conceitos, tiveram acesso. A “estrutura descontínua do mundo das ideias”, mencionada acima, explica-se, portanto, pelo fato de elas serem “eternas constelações e sendo captados os elementos como pontos nessas constelações, os fenômenos são repartidos e salvos ao mesmo tempo” (UdT, 17). Nesse quadro, é de igual importância o fato de as ideias não os conceitos — serem a referência mais geral da linguagem, e, além disso, estarem na essência da palavra no seu momento de símbolo, do qual a linguagem empírica é já uma forma de corrupção. Por isso, segundo Benjamin, no cerne da teoria das ideias seria mais correto apontar Adão do que Platão: “O nomear adamítico está tão longe de ser jogo e arbítrio, que exatamente nele o estado paradisíaco enquanto tal se confirma, o qual não tem nada a ver com o significado comunicatico das palavras” (UdT, 19).

Aquela conexão genérica da verdade com a beleza começa a se especificar quando se introduz a identidade das ideias aos gêneros literários e artísticos, dentre os quais se destaca o do drama barroco alemão (UdT, 20) — tema da obra em questão. Nesse plano mais específico, destaca-se uma outra proposição sobre a ideia: o fato de ela ser “mônada” num sentido semelhante ao atribuído ao termo por Leibniz na sua Monadologia. Ouçamos Benjamin: “A ideia é mônada. O ser que, com pré e pós-história, entra nela, fornece na própria figura ocultamente a figura abreviada e obscurecida do restante mundo das ideias, tal como nas Mônadas do ‘Tratado metafísico’ de 1886 em cada uma delas respectivamente todas as outras estão obscuramente dadas. A ideia é mônada nela repousa preestabelecida a representação dos fenômenos enquanto sua interpretação objetiva” (UdT, 30).

Esse conceito de mônada aplicado à filosofia da arte vital para Adorno, como se verá em seguida — foi temporariamente deixado de lado por Benjamin, em função do tratamento do outro tema a ser abordado aqui: o da reprodutibilidade técnica da obra de arte. Benjamin parte da constatação de que as obras de arte sempre foram reprodutíveis — sempre houve meios artesanais para a sua duplicação. O surgimento da fotografia em finais do século passado, antes do qual apenas a litografia existia como meio de reprodução de figuras, inaugurou a época da reprodutibilidade técnica da obra de arte (KZtR, 10). A partir daí houve uma subversão total no processo de produção artística, pois a singularidade de uma obra de arte, diante da qual qualquer reprodução antes seria obrigada a reconhecer sua inferioridade, perde totalmente sua relevância: torna-se sem sentido falar-se em “original no caso da fotografia ou do cinema (certamente não seria o seu negativo ou a primeira cópia feita a partir dele) (KZtR, 12). Benjamin resume esse processo de desvalorização da singularidade do objeto estético na perda de sua aura — espécie de distanciamento compulsório em que a obra de arte convencional lança aquele que a contempla (KZtR, 15) — saudando o advento da fotografia e do cinema — construtos essencialmente inauráticos — como a libertação da arte em geral do jugo da tradição: “O que na época da reprodutibilidade técnica da obra de arte se estiola é a sua aura. O processo é sintomático, seu significado ultrapassa o âmbito da arte. A técnica de reprodução, pode-se dizer genericamente, retira o que é reproduzido do âmbito da tradição. Multiplicando a reprodução, ela põe no lugar de seu acontecer singular um massivo (KZtR, 13).

Quando Benjamin fala “tradição”, ele se refere, antes de tudo, ao fundamento religioso da arte do passado, ao fato de o seu “valor de culto” ser muito mais pronunciado que o seu “valor de exposição” — quando esse chega a existir —, isto é, ao aprisionamento da arte a um sistema de dominação com base na religião e a superação da tradição significa a “sua fundação numa outra práxis: a saber, sua fundação na política” (KZtR, 18). Sobretudo em relação ao cinema, Benjamin encontra elementos de uma verdadeira revolução estética — a libertação dos sentidos da imanência da percepção normal, cotidiana — acompanhada de uma situação de potencial subversão política — o proletariado vivendo massivamente nas grandes cidades e, ao mesmo tempo, vítima de crescente espoliação. Esses elementos juntam-se numa combinação explosiva: A massa é uma matriz, da qual advém renascido no presente todo comportamento diante de obras de arte. A quantidade tornou-se qualidade: as massas de participantes, muito maiores, ocasionaram um tipo transformado de participação” (KZtR, 39). Benjamin refere-se a uma espécie de desmistificação na percepção estética, de acordo com a qual a contemplação tradicional — tributária da adoração religiosa — dá lugar a uma recepção distraída, desconcentrada (KZtR, 40). Essa mudança é interpretada como a passagem de um tipo de percepção ótica para um outro — tátil — em virtude de o primeiro ter esgotado suas potencialidades estético-históricas. O cinema, portanto, seria o instrumento ideal para a concretização dessa mudança — o que não é comprometido pelo fato de sua produção se encontrar nas mãos do grande capital industrial (KZtR, 28). Pois a apropriação da criação filmográfica pelas forças estéticas representantes do proletariado revolucionário torna-se programática no sentido de ampliar a revolução estética latente no cinema numa subversão política capaz de pôr fim ao jugo encabeçado pela burguesia. Benjamin identifica, portanto, a superação das formas tradicionais de arte com a luta pela emancipação do proletariado e, em especial, contra a modalidade mais nociva de dominação burguesa até então conhecida: o nazi-fascismo, cuja estratégia incluía a exploração planificada de uma linguagem estética: “Dessa forma ocorre a estetização da política que o fascismo leva adiante. O comunismo o responde com a politização da arte” (KZtR, 44).

As colocações de Benjamin são de importância capital para a estética adorniana no que se refere tanto à Origem do drama barroco alemão, quanto ao texto sobre a reprodutibilidade técnica da obra de arte. No que tange ao primeiro texto, mesmo diante de muitas possibilidades de abordagem (constelações, alegoria etc.), destaca-se um conceito que se mostrará estreitamente conexo a uma das questões centrais desta investigação, a relação da manifestação estética com o que lhe é exterior. Trata-se do conceito de mônada acima aludido —, o qual passa por uma verdadeira mutação na Teoria estética de Adorno. Em Benjamin, a mônada é uma ideia “platônica” que preside de fora, de um mundo separado, a consolidação de um gênero estético, cuja relação com sua origem permanece problemática. Adorno concebe a própria obra de arte — não mais a sua ideia — como mônada, delineando, com isso, uma solução para o espinhoso problema das relações dos fenômenos com as ideias, Mas permanece a noção central da mônada que, não obstante ser “sem janelas”, reflete todo o universo, estabelecendo uma dialética universal-particular que se revela indispensável para a correta compreensão da relação da obra de arte com a história: Não há qualquer determinação do particular numa obra de arte, que não saísse da mônada, segundo sua forma, como um universal” (ÄT, 269). Essa dialética especifica-se na relação da obra (particular) com a história (universal), de um modo assim descrito: Ela é me diatizada com a história real através de seu núcleo monadológico. O conteúdo das obras de arte pode se chamar de história. Analisar obras de arte significa tanto quanto se inteirar da história imanente nelas armazenada” (ÄT, 132).

Mas essa equação do conteúdo das obras com a história não pode, de modo algum, ser entendida como imediata, pois, se assim fosse, a noção de mônada não poderia ser a ela aplicada. Trata-se, aqui, de um enfoque semelhante ao supramencionado, da arte como antítese social da sociedade, no qual a imagem da sociedade, enquanto algo extra-estético por excelência, só aparece no interior da obra transm.utada numa ressonância estética dos seus antagonismos. Em relação a isso, Adorno defende a arte de vanguarda das acusações de herrnetismo e introspecção, apontando para o caráter de falsificação que a explicitação literal dos conteúdos sociais na arte pode ter:

Um argumento do Diamat [materialismo dialético oficial] não carece prima vista de força de persuasão. O ponto de vista da modernidade radical seria o do solipsismo, o de uma mônada, que — limitada — se fecharia a intersub-jetividade […] A infra-estrutura de um sujeito coletivo imediato seria ilusória e condenaria a obra de arte à inverdade, porque aquela retiraria dessa a única possibilidade de experiência que hoje é possível. Se a arte se orienta corretivamente, a partir de uma visão teórica, ao seu próprio ser mediada e procura pular fora do seu caráter de mônada — visto como aparência social –, a verdade teórica permanece exterior a ela e se torna inverdade. (ÄT, 384-5).

Interessantemente, essa posição assumida por Adorno a partir de uma remodelação do conceito benjaminiano de mônada, fornece-lhe o instrumental para criticar a ideia central da Obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica, de que os meios técnicos reprodutíveis oferecem o pressuposto de uma revolução estética — correlativa da política. Para Adorno, o que é potencialmente revolucionário na arte não são os meios de que ela se vale, mas exatamente o seu procedimento monadológico, que atinge o cerne de sua lei formal: Onde, entretanto, a arte autônoma absorve seriamente os procedimentos industriais, eles lhe permanecem exteriores. A reprodutibilidade massiva não se tornou para ela em lei formal imanente, como a identificação com o agressor faz de bom grado. Mesmo no cinema os momentos industriais e os artístico artesanais dissociam-se sob a pressão econômico social. A industrialização radical da arte, sua adaptação irrestrita ao padrão técnico alcançado colide com aquilo que na arte se recusa à incorporação” (ÄT, 322).

Sem desconhecer a contribuição prestada pelo texto de Benjamin (ÄT, 89), Adorno teme que alguns aspectos de sua teoria possam ser distorcidos para fins de legitimação daquilo que se coloca no campo oposto da emancipação do proletariado: a indústria cultural e o seu planificado controle das consciências: “O veredicto sobre a aura passa rápido pela arte qualitativamente moderna, que se distancia da lógica das coisas habituais e cobre, por outro lado, os produtos da cultura de massa, nos quais está enterrado o lucro, e cujo rastro eles portam ainda nos países chamados socialistas” (AT, 89-90). Dessa forma, Adorno reforça uma das teses principais de sua estética: a de que a lei formal é o princípio básico de toda manifestação artística, e que, por conseguinte, sua referência ao que lhe é exterior se dá por uma tradução em termos da imanência daquela lei.

Concluindo, poder-se-ia dizer que esse princípio é o que especifica a posição de Adorno não apenas em relação a Walter Benjamin, mas a todos os autores aqui tratados. De Kant ele se aproxima na afirmação da “autonomia” do belo e da reflexão sobre ele, distanciando-se naquilo que, nela, ele considera unilateral: a perda de vista total do nexo da experiência estética com o que lhe é factualmente exterior, com sua “materialidade”. Em Hegel, Adorno vê exatamente o que falta a Kant: a conexão explícita da arte com a história — materializada em obras de arte — faltando, entretanto, uma determinação mais estrita do que é intrinsecamente estético (lembrando ainda que, no que tange ao belo natural, a maior proximidade a Kant é inequívoca). Postura semelhante ocorre em relação a Marx com o atenuante, para ele, de não ter tencionado fazer estética num sentido mais específico. A proximiclacle de Nietzsche se expressa no nexo primordial entre o fenômeno estético e a vida, que, em ambos os autores, leva à colocação da arte numa posição central em suas concepções de filosofia. Adorno insiste, no entanto, na valorização do contrapolo da adesão da arte à vida — no programático ascetismo da arte nova —, o que o distancia de Nietzsche. A presença de impulsos vitais — de pulsões — na manifestação estética é o que aproxima Adorno de Freud, sendo que a condenação da teoria psicanalítica da arte ocorre em função da desvalorização, por ela — de um modo paradoxalmente semelhante ao de Kant —, dos elementos intrinsecamente estéticos dos objetos por ela abordados.

 

[1] Immanuel, Kant. Kritik der Urteilskraft, Frankfurt (M), Suhrkamp, 1986. P. A XLVIII. A partir daqui, as referências a essa obra serão feitas no corpo do texto, designadas por KdU seguido do número da página, tudo entre parênteses.

[2] Por exemplo, Kritik der reinen Vernunft, Hamburgo, Felix Meiner Verlag, 1976. Analítica transcendental, B 95 ss.

[3] Theodor W. Adorno. Ástbetische Tbeorie, Frankfurt (M), Suhrkamp, 1986. Designada a partir daqui por AT seguido do número da página.

[4] F. W. J. Schelling, System des transcendentalen Idealismus, em Ausgewdblte Schriften, vol. I, Frankfurt (M), Suhrkamp, 1988, p. 690.

[5] G. W. F. Hegel. Vorlesungen über die Ástbetik I, em Werke 13, Frankfurt (M), Suhr-kamp, 1989, pp. 13-5. Designado a partir daqui por VA. I, seguido do número da página.

[6] Acompanho aqui a argumentação explicitada no meu texto “Morte da imortalidade — Adorno e o prognóstico hegeliano da morte da arte”, em Rodrigo Duarte (org.), Morte da arte, boje — Anais, Belo Horizonte, Laboratório de Estética da FAFICH-UFMG, 1993, pp. 135-45.

[7] Cf. Max Horkheimer e Theodor Adorno, Dialektik der Aufklarung, Frankfurt (M), 1981, pp. 180-3.

[8] Theodor W. Adorno. Minima Moralia, Frankfurt (M), Suhrkamp, 1987, pp. 187-8. A partir daqui designado por MM, seguido do número da página.

[9] Cf. Idem, Dissonanzen. Musik in der verwalteten Welt, Gottingen, Vandenhoeck & Ruprecht, 1982, p. 13. Ver também ÁT, 26, 128; MM, 155, 300.

[10] Cf. idem, Prismen. Kulturkritik und Gesellschaft. Frankfurt (M), Suhrkamp, 1987, p. 159.

[11] Karl Marx, Die Deutsche Ideologie, em Ausgewãhlte Werke I, Berlim, Dietz Ver-lag, 1981, p. 212. A partir daqui designado por DI, seguido do número da página.

[12] Idem, Grundrisse der Kritik der politischen Õkonomie em Marx Engels Werke 42, Berlim, Dietz Verlag, 1983, p. 45.

[13] Friedrich, Nietzsche, Werke I, Frankfurt, Berlim e Viena, Verlag Ulstein, 1980, p. 40. A partir daqui designado por WW, seguido do número do volume em algarismos romanos e do número da página em algarismos arábicos.

[14] Sigmund Freud, Schriften zur Kunst und Literatur. Frankfurt (M), Fischer Verlag, 1987, p. 104. A partir daqui designado por SKL, seguido do número da página.

[15] Freud chega a declarar sua preferência por analisar obras de comprovada inferioridade estética: “[…] escolhamos para nossa comparação [entre sonhos diurnos e obras de arte] não exatamente aqueles escritores que sejam apreciados pela crítica como mais elevados, mais os mais despretensiosos narradores de romances, novelas e contos, que, por isso, encontram os leitores e leitoras mais numerosos e vorazes” (SKL, 176).

[16] Walter Benjamin, Ursprung des deutschen Trauerspiels, Frankfurt (M), Suhrkamp, 1987. A partir daqui designado por UdT, seguido do número da página.

[17] Idem, Das Kunstwerk im Zeitalter seiner technischen Reproduzierbarkeit, Frankfurt (M), Suhrkamp, 1986. A partir daqui designado por KZtR, seguido do número da página.

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